domingo, 24 de maio de 2009

Tema 21 - Propriedade privada e protecção do ambiente: em busca da concordância prática

Direito do Ambiente e a tutela processual das relações de Vizinhança

1 – Perspectiva jurídico-constitucional

O conflito entre o exercício de direitos é comum, muitas vezes justificado pela proximidade e frequência do convívio entre pessoas, impondo-se medidas de harmonização criando limitações dos vários direitos em confronto.
Estas restrições que ocorrem normalmente sobre o direito de propriedade e direitos reais têm como objectivos a salvaguarda do direito do ambiente.
A lei admite varias medidas processuais ao dispor do “vizinho” quando este considere que o meio ambiente onde esta inserido se encontra violado.
O direito do ambiente é protegido desde logo pela nossa CRP, havendo que chegue a falar numa “Constituição do Ambiente global e coerente” – José Gomes Canotilho. Na Constituição Portuguesa estão estabelecidas normas que consagram um direito fundamental ao ambiente e qualidade de vida – art. 66/1, assim como regras impositivas de um dever Jurídico-Constitucional do ambiente – art. 66/2, normas-fins – art. 9 alínea d) e e) e ainda normas impositivas de politica ambiental nos artigos 81, alínea l) e 93/1 alínea d) e 93/2.
Esta consagração, como direito fundamental ao ambiente, deixa de lado as teses reducionistas do bem ambiental a um bem meramente privatístico ou a um bem exclusivamente publico. O direito do ambiente deve ser tutelado de forma compreensiva e unitária, surgindo do ponto de vista estrutural como um direito ecológico. Teremos de ter sempre em conta que o ambiente é “construído e conformado pelo Homem, sendo sempre os seus elementos de base os elementos naturais.
Defende-se que o direito constitucional do ambiente apresenta uma dupla dimensão; uma negativa, onde o Estado e terceiros têm o dever de se abstenção relativamente a acções nocivas para o ambiente – artigo 66/1 da CRP, surgindo como direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias enunciados no artigo 17 da CRP. Na dimensão positiva, surge como direito a prestações positivas do Estado – artigo 66/2 da CRP. Sendo um direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias é aplicável ao direito do ambiente o art.18 da CRP directamente.
É nesta dupla dimensão do direito ao ambiente que surge a problemática das relações de vizinhança. Hoje é admitido que alguém lesado (o vizinho) invoque para além do seu direito de propriedade, o direito ao ambiente e qualidade de vida, quando houver violação deste direito por emissões ou construções de obras. Mas também existe por parte do Estado e da Administração pública o dever de assegurar “um ambiente de vida humana, sadio e ecologicamente equilibrado”, quer através da planificação e ordenamento do território, quer através do licenciamento de obras, construções e actividades potencialmente poluidoras – art. 66 CRP.

Para que se possa falar em tutela processual do vizinho lesado é necessário saber o que é uma relação de vizinhança. Podemos definir relação de vizinhança como “ aquela que emerge da circunstância de, muitas vezes, o aproveitamento integral das utilidades proporcionadas por um prédio, importar a lesão, em termos e grau incomportáveis, dos titulares de direitos sobre outros prédios.
Esta relação é importante para o direito administrativo, uma vez o pleno aproveitamento das referidas utilidades está condicionado a autorizações administrativas.
Nas relações de vizinha intervêm mais de dois sujeitos em conjuntos interligados de posições activas e passivas. Numa parte estão presente as entidades administrativas de onde surgem os actos administrativos, do outro lado os particulares destinatário e beneficiário do acto administrativo, e finalmente o terceiro, que poderá ser um ou mais sujeitos (vizinho ou vizinhos), lesado pelo mesmo acto. Este último será titular de uma posição jurídica subjectiva, que uma vez verificada lhe permitira reagir, quer contra a entidade administrativa, quer contra o particular beneficiário desse acto administrativo.
Para que haja tutela jurisdicional do terceiro prejudicado pelo acto administrativo, (o direito de propor uma acção ou recurso para assegurar este direito), devera existir um verdadeiro interesse subjectivo público.
Sendo o direito ao ambiente e qualidade de vida um direito fundamental, assumido como direito, liberdade e garantia, atribui ao seu titular o poder jurídico individualizado de defesa dos seus interesses contra a Administração.

Para que possamos falar de um verdadeiro direito, teremos de analisar em primeiro lugar se as normas reguladoras da actividade administrativa têm como objectivo proteger apenas ou também os interesses dos particulares, e em seguida teremos “de tomar em consideração esses interesses”. Podemos retirar daqui que nas relações jurídico-publicas de vizinhança, por regra as normas visam proteger esses interesses e mesmo quando isso não aconteça, existe um “dever de os proteger”.

Em direito civil, a concepção de terceiro-vizinho, é demasiado restrita para o direito do ambiente. No entanto, adoptando a doutrina de Gomes Canotilho alguns critérios deverão ser tidos em conta. Para este professor, serão vizinhos “os sujeitos que integrem o conjunto de pessoas diferenciado da colectividade em geral, cuja localização espacial seja abrangida pela norma ou normas reguladoras do acto administrativo, sendo que a sua ligação ao local deverá ter um carácter permanente”. Se estas exigências se verificarem podemos falar de um verdadeira lesão qualificada do direito ao ambiente e qualidade de vida.

2 – Meios processuais da tutela do terceiro-vizinho face a lesões no seu direito ao ambiente

2.1 - Acto Administrativo autorizativo ilegal

Supondo que uma autorização vinda de uma autoridade administrativa competente para instalar uma industria de curtumes numa determinada zona, com capacidade de tratamento de peles inferior a 12 toneladas por dia, mas que assenta num erro quanto a um pressuposto de facto, na medida em que não obedece a uma determinada exigência ambiental. O acto será pois anulável. Admitindo que da instalação e exploração desta industria resultam lesões para o direito do ambiente de um terceiro que habita nas imediações da zona. O proprietário do estabelecimento industrial defende-se no acto administrativo.
Nesta situação, teremos que atender, em primeiro lugar, que o terceiro-vizinho enquanto titular do seu direito subjectivo público ao ambiente, tem legitimidade a agir, enquanto está em causa a aplicação de normas que protegem os interesses ambientais dos vizinhos – por exemplo impõem-se limites à carga de efluentes produzidos, com que se visa tutelar não só os interesses públicos ambiental e de saúde, mas também os direitos, individualmente considerados, a um ambiente são e à integridade física.
Assim, o particular pode impugnar o acto administrativo ilegal, ao abrigo do qual ocorre a actividade lesiva do seu direito, através do recurso contencioso de anulação, garantido constitucionalmente no artigo 268/4 da CRP.
Tratando-se de um acto administrativo eficaz e anulável, e o terceiro-vizinho tem de acordo com os artigos 53 e 153 do CPA, um interesse directo, pessoal e legitimo na anulação do mesmo acto (uma vez que retira imediatamente do facto da anulação um beneficio especifico para a sua esfera jurídica, tendo no caso de invocar a titularidade de uma posição jurídica subjectiva lesada), tal recurso devera obter provimento, através de uma sentença constitutiva, gerando a obrigação para a administração de, em execução da sentença, reconstituir a situação de facto de acordo com o julgado. Por força dos “efeitos ultra constitutivos da sentença de anulação do acto administrativo”, a administração tem o dever de colocar a situação de facto de acordo com a situação de direito constituída pela decisão judicial de anuição: o particular tem direito à reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto ilegal ou se o acto tivesse sido praticado sem a ilegalidade – reconstituição da situação hipotética actual.
Se em todo o caso, a administração não cumprir esse dever, mesmo após requerimento do interessado, este pode requerer ao tribunal administrativo a declaração de inexistência de causa legitima de inexecução, devendo o tribunal, no caso emitir tal declaração, especificar os actos e operações de execução e o prazo em que deverão ter lugar, anular os actos que eventualmente hajam sido praticados ao abrigo de causa legitima de inexecução não reconhecida, e ainda, declarar nulos os actos praticados em desconformidade com a sentença – art. 9/2 do DL 256-A/77.
O particular poderá ainda nos termos do CPTA, intentar uma acção administrativa especial de anulação ou declaração de nulidade dos actos administrativos – artigo 2/2/ d), 50º e SS. do mesmo diploma. Assim, terá legitimidade para dispor deste meio processual quem alegue ser titular de interesse directo e pessoal. Nos termos da execução da sentença, e lei prevê que se a administração não executar a mesma no prazo legalmente exigido, e sem qualquer fundamentação, pode o particular, nos termos dos artigos 175º e 163º, pedir a execução da sentença perante o tribunal administrativo, devendo especificar os actos e operações em que se traduz a execução, sendo-lhe ainda reconhecida a faculdade de solicitar a fixação de um novo prazo para o cumprimento do dever de executar, e a imposição de uma sanção pecuniária compulsória – artigo 169º. Refira-se ainda que este pedido por ser formulado no momento da proposição da acção de anulação do acto administrativo, como decorre da possibilidade de cumulação desta com o pedido de condenação à prática de actos e operações para restabelecimento de situações jurídicas subjectivas, funcionado esta de forma complementar daquela – art. 4/2 alínea a) e 47/2/ alínea b).

O particular-vizinho tem ainda a possibilidade de suspender a eficácia do acto administrativo autorizativo. No caso concreto, importará fazer e ponderação entre, por um lado a lesão do direito ao ambiente titulado pelo vizinho e do interesse público ambiental, e por outro, a lesão do interesse público económico ou de interesses de outra natureza, de modo a determinar se da suspensão resulta ou não grave lesão para o interesse público que inviabilize este pedido, atendendo a que os danos ambientais são, pela sua natureza irreparáveis e irreversíveis. Defendendo a opinião do Prof. Freitas do Amaral, quando se verifique uma lesão do interesse público, e estando em causa um direito fundamental a suspensão deve ser decretada, pelo menos se se tratar de um direito, liberdade e garantia, cujo núcleo essencial desse direito seja violado, sendo o acto administrativo nulo, nos termos do artigo 133º do CPA.

Finalmente o particular dispõe da possibilidade de propor uma acção de responsabilidade extracontratual por actos de gestão pública contra a Administração, nos termos do art. 7 da lei 67/2007, por factos ilícitos.

A acção de responsabilidade civil assume no CPTA uma designação distinta, no entanto com objecto semelhante, trata-se efectivamente de uma acção administrativa comum de condenação da administração à reintegração natural dos danos ou ao pagamento de indemnização pecuniária – art. 2/2, alínea f) e 37/1 e 2 alínea f) e g).

Refira-se ainda que nos termos do artigo 109º e SS. do CPTA, o vizinho tem ao seu dispor um meio processual urgente: a acção de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, embora subsidiaria em relação ao decretamento provisório de providencias cautelares, uma vez que só se poderá lançar mão da mesma se a possibilidade prevista no artigo 131º não for suficiente para garantir a tutela pela do direito ao ambiente. Assim o particular poderá recorrer a esta acção quando se mostre indispensável para assegurar o exercício em tempo útil do direito uma decisão de mérito que imponha à administração uma determinada conduta positiva ou negativa. Se pelo contrário, a tutela do direito ao ambiente depender de uma decisão vinculada, então pode o tribunal emitir sentença produtora dos efeitos do acto devido.

O particular lesado tem também ao seu dispor os meios jurídicos civis de tutela; pode intentar uma acção inibitória tendente a negar o direito do particular destinatário do acto. Uma vez estando perante uma relação de vizinhança jurídico-civilística que não se descaracteriza pelo facto de ter ocorrido uma intervenção administrativa. Tendo em conta que esta relação é construída a partir do direito de propriedade e que este hoje já não pode ser concebido como um direito “absoluto”, uma vez que comporta limitações.
Devemos partir então do artigo 1305º do CC e invocando Antunes Varela, esta norma “ funciona como um pólo de concentração de todas as limitações à propriedade, dispersas não só pelo código, mas principalmente pela legislação administrativa, e à luz delas é que define o perímetro normal dos poderes atribuídos ou reconhecidos ao proprietário”. Pode então o proprietário invocar o artigo 1346º do CC, para se opor às emissões de gases e cheiros que invadem o seu prédio. Nesta situação o vizinho, não é o vizinho em sentido ambiental ou urbanístico, mas sim o “vizinho civilístico”, circunstancia que restringe as categorias de pessoas legitimadas a agir. Pressupondo que este terceiro lesado é também um vizinho à luz do direito civil, terá direito de se opor às emissões, quando as mesmas importem um prejuízo substancial para o uso do imóvel concreto, ou quando não resultem da utilização normal do prédio de que emanam. Tudo somado, bastara para o particular recorrer aos tribunais comuns requerendo a cessação de tais emissões, através de uma acção declarativa negatória ou condenatória, uma vez que o direito do vizinho estará a ser perturbado ou limitado pela actividade industrial.

Vaz Serra, após o surgimento de alguns problemas de interpretação deste artigo 1346º do CC face à possível utilização para defesa do direito ao ambiente, veio afirmar, defendendo que a expressão “prejuízo substancial” para o uso do prédio não abrangia apenas os danos surgidos da relação de vizinhança que atingissem o proprietário do imóvel, mas também as lesões de direitos de personalidade dos habitantes do mesmo. Face à projecção do direito do ambiente, como direito fundamental, não pode deixar de lhe ser assegurada uma tutela efectiva, pelo que numa “interpretação constitucionalmente adequada”, há de caber no art. 1346º a tutela de outros direitos, mesmo daqueles que visam assegurar o gozo de bens materiais. Para além de que se tem vindo a entender que os efeitos nocivos sobre o prédio não são só os que atingem o prédio directamente, mas também os que afectam a segurança, a saúde, ou a tranquilidade das pessoas (Pires de Lima/ Antunes Varela), admite-se por isso que deva ai ser considerado o bem ambiente.

De resto, é de salientar que o meio processual considerado não fica afastado por ter sido interposto o recurso contencioso de anulação, por não haver perigo de litispendência ou de caso julgado, uma vez que não existe identidade de sujeitos, nem identidade de pedido e muito menos de causa de pedir.


2. 2 – Acto administrativo autorizativo legal

Para ilustrar uma situação de um acto administrativo autorizativo legal que viole o direito ao ambiente, imagine-se a seguinte situação: existe um acto autorizativo da instalação e funcionamento de uma fábrica de curtumes que cumpre todas as exigências legais e regulamentares relativas à localização, instalação e funcionamento. Existe um terceiro, que habita nas imediações desta nova fabrica, e que se sente prejudicado no seu direito ao ambiente e qualidade de vida, mas não dispõe da possibilidade de impugnação administrativa, pois o acto é legal.

A primeira pergunta que se poderá fazer é a seguinte: existindo inegáveis danos ecológicos, não poderá o terceiro lançar mão das acções inibitórias e de ressarcimento?

Ou será que a acto administrativo “apaga” a ilicitude das emissões e das restantes actuações do destinatário do acto, havendo preclusão da possibilidade de ser proposta qualquer dessas acções?

A resposta a esta pergunta terá duas alternativas: ou se admite que o acto autorizativo é causa justificativa da produção de efeitos lesivos na esfera jurídica de terceiros, ou então defende-se que, não obstante tal autorização pode a actuação do particular ao abrigo daquela ser considerada um ilícito na ordem jurídico-civil e como tal objecto das acções de defesa previstas nesse ordenamento.

Não fará sentido que uma conduta seja considerada “valida” em sede jurídico-administrativa e já não o seja em sede civilista ou do direito penal.
No entender de Gomes Canotilho perante uma contradição entre uma norma fixadora da ilicitude e uma norma que consagra uma causa justificativa, deve prevalecer a norma de justificação, desde que isso resulte inequivocamente da lei. Assim, a norma em causa deve consagrar expressamente a existência de um direito, cujo exercício importa lesões para terceiros ilícitas à luz do direito civil – efeito justificativo, e deve ainda prever a exclusão de acções de defesa por parte dos terceiros – efeito preclusivo. Tais efeitos não poderão ofender princípios constitucionais de onde surge a necessidade de respeitar sempre os limites impostos pelos direitos fundamentais, seja como direitos de defesa, seja na sua dimensão jurídico-objectiva. Havendo sacrifícios que recaiam sobre terceiros lesados, estas devem resultar da lei, uma vez que estão em causa restrições aos direitos fundamentais – princípio de reserva de lei (art. 18/2 da CRP). Finalmente deve ser respeitado o princípio da proibição do excesso, que determina que essa restrição deve ser sempre necessária, adequada e proporcional.

Daqui se retira que o particular depara-se com a impossibilidade de recorrer a acções de defesa previstas no direito civil.

Ao terceiro-vizinho resta a possibilidade de propor a acção de responsabilidade por factos lícitos, junto dos tribunais comuns, para que seja declarada a existência e a violação do direito e se determine ao lesante a realização da prestação destinada a reintegrar o direito violado, ou a reparar a falta cometida.

A questão que deve ser colocada diz respeito a quem deve responder por tais danos, uma vez que existiram duas condutas que contribuíram para a lesão do direito ao ambiente: a conduta da administração a autorizar a instalação do estabelecimento industrial, e por outro lado a conduta do particular destinatário do acto autorizativo, que explora a referida fabrica.

Por força do princípio “ubi commoda, ibi incommoda” deve ser o particular beneficiário da referida fabrica a suportar os danos que através dela cause – artigo 1347/2 e nº 3 do CC.

No entanto, é defendido por Filipa Calvão que esta solução não afasta a possibilidade de accionar a administração para a obtenção do ressarcimento dos danos, ainda que de forma subsidiária. A autora refere vários argumentos em favor desta segunda hipótese.
Em primeiro lugar refere que o acto administrativo é também ele causa adequada o dano, nos termos do artigo 563º do CC.
Em segundo lugar refere Filipa Calvão que a dimensão jurídico-colectiva dos direitos fundamentais impõe limites aos efeitos legalizador e preclusivo do acto administrativo, de modo que o Estado, tem de assumir ”uma espécie de responsabilidade perante eventuais lesões aos direitos fundamentais dos cidadãos”, argumento dado pelo professor Gomes Canotilho, pois é dele que dimana a “luz verde” para a conduta lesiva de um direito fundamental.
Em terceiro lugar, a responsabilidade subsidiaria é a solução adoptada para indemnização devida pela expropriação, quando a entidade expropriante não seja o próprio Estado – art. 21 do Código das Expropriações, embora admitindo que estas não serão situações análogas, uma vez que a expropriação tem em vista a satisfação directa e imediata de um interesse publico.
Em quarto e último lugar, a autora refere que deverá “procurar-se a solução que melhor tutele os direitos fundamentais, sobretudo aqueles que integram o catálogo dos direitos, liberdades e garantias, ou os que são análogos a estes”.
No entanto, é de referir sempre o direito de regresso do Estado sobre o destinatário do acto administrativo, uma vez que é este quem retira mais vantagens da actividade lesiva. Veja-se nesta matéria o artigo 6 da recente Lei 67/2007 de 31 de Dezembro.

Na hipótese referida em cima, teremos ainda de equacionar a situação correspondente ao caso em que aquela fabrica não cumprir as condições impostas na autorização, ou de alguma forma, não obedecer aos requisitos estabelecidos nessa mesma autorização. Aqui o particular destinatário do acto autorizativo não poderá invocar os efeitos justificativo e preclusivo deste, pois estes cessam onde no exista conformidade entre a autorização e o estabelecimento autorizado.

Nesta situação o particular tem ao seu dispor dos meios processuais civis, a acção condenatória e a acção de responsabilidade civil por factos ilícitos, dirigida contra o particular desencadeador do acto lesivo.
Pode ainda intentar uma acção para reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido, nos termos do CPTA.


Uma outra via é a defendida entre nos por Gomes Canotilho e Carla Amado Gomes de uma acção de responsabilidade civil por factos ilícitos contra a Administração, pela omissão indevida de fiscalização da actividade industrial previamente autorizada e das respectivas emissões – artigo 2/2 alínea a) do CPTA de onde se retira ser utilizável a acção comum de reconhecimento de situações jurídicas subjectivas directamente decorrentes de normas jurídico administrativas ou de actos jurídicos administrativos, por quem alegar ser titular de um direito subjectivo, tratando-se de uma acção de simples apreciação, seguindo os tramites da acção comum. Deve no entanto o particular titular do direito subjectivo cumular com este pedido, uma acção administrativa comum de condenação da administração à prática de actos e operações necessários ao restabelecimento da situação jurídica nos termos do artigo 2/2 alínea j) do CPTA. E eventualmente caberá ainda ao vizinho, na medida em que o cumprimento do dever de controlo da actividade autorizada se traduza na emissão de actos administrativos, justifica-se a proposição da acção administrativa especial de condenação da administração à pratica de acto legalmente devido, nos termos do disposto nos artigos 2/2 alínea i), 46º e 66º.

Finalmente, tal como ocorrerá numa hipótese de actuação administrativa ilegal (ponto 2.1), também perante uma omissão indevida da administração o terceiro vizinho dispõe, nos termos dos artigos 109º e SS. do CPTA, da acção de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, a qual poderá ser dirigida contra o próprio particular lesante, como decorre do art. 109/2 do mesmo diploma.