domingo, 31 de maio de 2009

Responsabilidade civil por danos ecológicos

Responsabilidade civil por danos ecológicos



Do meio ambiente como “meio agressor” ao ambiente como “bem jurídico agredido”

A questão da responsabilidade pelos danos ao ambiente foi objecto de tratamento por parte da doutrina, sendo que o “dano ao ambiente” era visto como “o dano causado às pessoas e às coisas pelo meio ambiente em que vivem”.
Assim, o problema central consistia na reparação dos danos subsequentes às perturbações ambientais.
Numa fase inicial, a construção do estado de direito ambiental alicerçou-se fundamentalmente em mecanismos de prevenção e controle.
Na falta de legislação específica que consagrasse modelos de imputação de danos adequados às exigências ambientais, e que solucionasse os problemas causados por esses danos, a atenção da doutrina centrou-se na adaptação das estruturas de imputação existentes.
No entanto, através de uma progressiva protecção autónoma e imediata de bens ambientais, levanta-se a necessidade de autonomizar os prejuízos causados ao próprio ambiente, dos prejuízos causados ao Homem e às coisas através do meio ambiente.
Assim, procura-se distinguir do conceito de danos ambientais (enquanto danos causados pelo ambiente à saúde, aos bens imóveis e móveis ou ao património em geral), dos danos causados à Natureza em si, ao património natural e aos fundamentos naturais da vida.


O princípio da responsabilização

Este princípio encontra-se previsto na alínea h) do artigo 3º da LBA, onde se prevê que os utilizadores do ambiente assumem as “ consequências para terceiros da sua acção, directa ou indirecta, sobre os recursos naturais”.
As acções referidas incluem não só as condutas que coloquem bens ambientais em risco ou em perigo mesmo que não causem danos efectivos, como também os custos da reparação e os das medidas preventivas funcionalmente dirigidas a evitar os danos.
Esta ideia permite fundamentar a imputação de externalidades, ou de custos ambientais, mediante o recurso a outros instrumentos jurídicos directos (sanções administrativas) e indirectos (exemplo, taxas e impostos ambientais).
O princípio da responsabilidade fundamenta-se, por um lado, no princípio do poluidor pagador e, por outro, no direito de polícia.
Evidentemente que o princípio da responsabilidade deve ser complementado com o princípio da repartição comunitária. Este último princípio determina que os custos de prevenção e reparação dos danos ecológicos devem ser suportados pelo Estado quando não seja possível (ou quando não se justifique) imputá-los ao seu causador.


Instrumentos de protecção jurídico-ambiental

Planos e programas:
 Inserção da dimensão ambiental no planeamento e nas contas públicas;
 Planos gerais de política ambiental;
 Planos sectoriais de política ambiental.

Instrumentos normativos de regulamentação directa:
 Normas de determinação da qualidade ambiental;
 Sanções preventivas;
 Instrumentos de gestão da informação e do conhecimento;
 Sanções administrativas;
 Sanções repressivas;
 Responsabilidade civil;
 Responsabilidade contra-ordenacional;
 Responsabilidade penal.

Instrumentos normativos de regulamentação indirecta:
 Taxas e impostos ambientais;
 Subsídios;
 Instrumentos financeiros e fiscais;
 Benefícios fiscais;
 Empréstimos a fundo perdido ou com juros bonificados;
 Certificação da qualidade ambiental de instituições.


Dano ecológico

O dano jurídico deriva de uma valoração operada pelo Direito. Consiste numa perturbação de bens juridicamente protegidos, sendo que, a sua relevância jurídica e justificação axiológica radicam na protecção que o direito concede a um conjunto de bens em razão dos fins que permitem atingir.
A procura de um conceito normativo de dano ecológico pressupõe, a compreensão de um conceito normativo de ambiente, sendo essencial considerar a protecção jurídico-constitucional que merece no ordenamento jurídico português.
Essa protecção é directamente assegurada pela constituição ao determinar o artigo 9º da CRP a “ defesa do ambiente” e a “ preservação dos recursos naturais”, mas também ao reconhecer-se no artigo 66º o direito ao ambiente e à qualidade de vida como direito fundamental. Desta forma, o tratamento jurídico do ambiente não se reduz à dimensão de tarefa Estadual, considerando-se, portanto, que os particulares são titulares de direitos subjectivos públicos.
O direito fundamental ao ambiente tem, assim, uma dupla natureza. Por um lado é um direito subjectivo, por outro constitui um elemento fundamental da ordem objectiva da comunidade.
O direito ao ambiente é, desde logo, um direito negativo (traduzindo-se na abstenção por parte do Estado e de terceiros de acções ambientalmente nocivas). Tem também uma dimensão positiva, obrigando o Estado e outras entidades a adoptar as medidas necessárias de defesa do ambiente e à preservação dos recursos naturais.
A tutela jurídico-ambiental consiste na regulamentação de condutas humanas que são susceptíveis de afectar a sua qualidade dos componentes ambientais. Essa protecção visa proteger ou conservar um determinado estado, um modo de ser dos bens naturais. Por exemplo, no que respeita ao ar, o estado de qualidade e equilíbrio ecológico é promovido através de normas de qualidade que fixam os valores indicativos e os valores limite no ambiente para determinados poluentes.
Assim, o estado de qualidade não é determinado por referência a uma norma isolada, sendo antes o padrão de qualidade resultante da concretização de todo o sistema juridico-ambiental.
O dano ambiental pode então ser entendido como a perturbação do estado do ambiente, determinado pelo sistema jurídico-ambiental. Pode, pois, ser caracterizado como uma perturbação do património natural (enquanto conjunto dos recursos bióticos e abióticos da sua interacção) que afecte a capacidade funcional ecológica e a capacidade de aproveitamento humano de tais bens, tutelada pelo sistema jurídico-ambiental.


O título de imputação

O direito do ambiente português, no que respeita ao título de imputação, adoptou o princípio da responsabilidade objectiva. No entanto, a imputação de danos com base no risco exige uma definição precisa e coerente de um conjunto de aspectos fundamentais:
 Identificação das actividades objectivamente perigosas;
 Identificação dos responsáveis;
 Prova de nexo de causalidade;
 Causas de exclusão da responsabilidade;
 Limites da obrigação de indemnização;
 Delimitação da eficácia espacial e temporal da situação de responsabilidade.

Contudo, não parece ser esta a solução do direito português, uma vez que o legislador criou estruturas de imputação demasiado vagas e imprecisas e que pode colocar em causa a eficácia e a eficiência do sistema.


Nexo de causalidade

O actual sistema é lacunar no que respeita à determinação do nexo de causalidade, ou seja, não existe nenhuma regra específica da responsabilidade ambiental sobre esta questão.
A solução parece ser a da aplicação analógica do artigo 563º do C.C. Esta regra requer desde logo um duplo juízo:
 Um juízo empírico mediante o qual se elege determinado facto como conditio sine qua non do dano considerado;
 Um juízo de imputação normativa exigindo que tal condição se revele em abstracto como causa adequada a produzir tal dano.
A aplicação da teoria da causalidade adequada (para que exista nexo de causalidade entre o facto e o dano não basta que o facto tenha sido em concreto causa do dano, em termos de conditio sine qua non, é necessário que, em abstracto, seja também adequado a produzi-lo segundo o curso normal das coisas) provoca muitas dificuldades que resultam, por exemplo, da incerteza científica sobre a causa, da concorrência de causas e do carácter indirecto e muitas vezes complexo do percurso causal.


Restauração natural

O direito português no artigo 48º da LBA determina que os infractores são obrigados a remover as causas da infracção e a repor a situação que existia anteriormente.
A restauração natural é aferida pela recuperação da capacidade funcional ecológica e da capacidade de aproveitamento humano do bem natural determinada pelo sistema jurídico, ou seja, pressupõe a recuperação da capacidade de auto-regeneração do sistema ecológico.
A restauração natural pode assumir duas formas:
 A restauração ecológica (visa a reintegração ou recuperação dos bens afectados);
 A compensação ecológica (visa a substituição dos bens naturais lesados por outros equivalentes, mesmo que situados num local diferente).


Indemnização pecuniária

Os danos ao ambiente podem ser susceptíveis de avaliação pecuniária. A avaliação monetária dos danos ao ambiente tende a justificar-se com três objectivos fundamentais:
 Permitir a compensação dos usos humanos afectados durante o período de execução da restauração natural;
 Possibilitar a análise da proporcionalidade das medidas de restauração natural;
 Permitir a compensação dos danos ecológicos quando a restauração natural se revele impossível.


Fases do procedimento

O processo de indemnização engloba as seguintes fases:
 Avaliação do dano;
 Identificação das alternativas de indemnização possíveis;
 Escolha da alternativa adequada.


Titularidade do direito à indemnização dos danos ecológicos


Decorre do nº3 do artigo 52º da C.R.P o direito dos particulares à indemnização de danos ao ambiente, ou seja, confere-se a todos o direito de promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infracções contra o ambiente, bem como a requerer a correspondente indemnização.
Desta forma, todos os cidadãos podem interpor uma acção popular para defesa dos bens ecológicos.





Bibliografia


Baptista Machado, João – Introdução ao direito e ao discurso legitimador, Coimbra, 1983

Cruz, Branca Martins da – Responsabilidade civil por dano ecológico, Porto, 1996

Marques Dos Santos, A. – Direito internacional privado e ambiente, Lisboa, 2002

Canotilho, J,J, Gomes – Vital Moreira – Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, 1992, 3ª ed.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Uma abordagem possível sobre a constitucionalidade dos contratos de adaptação ambiental

I. INTRODUÇÃO


O fenómeno da contratualização pública em matéria ambiental foi acolhida entre nós. Porém, a Doutrina suscita dúvidas, por um lado, quanto à eficácia do tipo específico de contratos que a Administração vem celebrando na consecução dos objectivos de redução do nível global das emissões poluentes e promoção da adaptação do sector industrial aos dispositivos legais em vigor (que transpõem directrizes comunitárias) e, por outro lado, quanto à sua compatibilidade com o princípio da legalidade e com o princípio da tutela procedimental de direitos e interesses dos administrados.

II. O PRINCÍPIO DA CONCERTAÇÃO ADMINISTRATIVA

São conhecidos os argumentos a favor das vantagens da utilização de instrumentos de concertação administrativa. De acordo com Ost, os acordos ambientais são vistos como um instrumento capaz de assegurar a responsabilização das empresas e o cumprimento generalizado das normas em vigor; por outro lado, os acordos garantem celeridade na execução dos objectivos traçados, por contraste com a tradicional lentidão do processo de produção de regulamentação imperativa, para além de permitir uma maior flexibilidade no processo de realização desses objectivos.
Fazendo uma análise de Direito Comparado, verificamos que nos Estados Unidos da América, a conclusão de “um contrato de instalação” entre o empresário e o município passa a ser requisito obrigatório para o deferimento por parte do Estado do pedido e licenciamento da unidade poluente; na experiência japonesa de contratação pública são correntes os contratos através dos quais as empresas poluentes se comprometem com as prefeituras ou municípios a cumprirem desempenhos ambientais que vão além dos standards legais; na União Europeia, o 5.º Programa de Acção Ambiental, aprovado em 1993, pelo Conselho, obrigaria a repensar o leque de instrumentos a utilizar na política ambiental sendo pois incentivadas as experiências de contratualização no quadro da Administração ambiental.
Nos últimos anos, no espaço europeu, praticamente todos os Estados-Membros usaram de uma forma ou de outra a via consensual com vista a alcançar objectivos ambientais.
Na Alemanha, o princípio da concertação em matéria ambiental, ali denominado de “Princípio de Cooperação”, foi pela primeira vez expressamente acolhido no primeiro programa de política do ambiente do executivo federal de 1971, que, vem enquadrar o fenómeno recente de a indústria e as autoridades públicas concluírem acordos de protecção ambiental que vão para além dos requisitos obrigatórios decorrentes da lei. Os principais respeitam à gestão de resíduos, à supressão progressiva de determinadas substâncias (amianto), às descargas de substâncias perigosas para as águas, e às emissões de CO2.
A França dispõe de um regime de polícia virado para a limitação ou interdição da poluição através de actos unilaterais autoritários; também aqui encontramos contratos de melhoria ambientais, sem derrogação de normas imperativas vigentes, salvaguardando-se as competências prefeitorais m matéria de licenciamentos de instalação industrial.
Com efeito, os contratos, enquanto instrumento de actuação da Administração do Ambiente, passaram a ser principalmente utilizados ou para disciplinar concertadamente o exercício, em procedimentos concretos, de poderes administrativos discricionários de polícia preventiva (em regra, acordos substitutivos de actos administrativos de licenciamento de instalação e elaboração de estabelecimentos industriais poluentes, através dos quais se estabelecem as obrigações a que os empresários ficam vinculados, das quais a Administração faz depender o deferimento dos seus pedidos), ou para fomentar e apoiar os empresários privados a diminuírem as emissões poluentes para níveis mais exigentes do que os máximos legalmente permitidos (em Portugal, escassos “contratos de melhoria de desempenho ambiental” celebrados pela DGA e os “contratos de promoção ambiental”, previstos pelo artigo 68.º do DL n.º 236/98, através dos quais as empresas se vinculam a desempenhos mais exigentes do que os que resultariam dos normativos em vigor).
Entre nós, os contratos ambientais apresentam muitos anos de atraso relativamente às primeiras experiências europeias. Estes têm por objecto o estabelecimento de um plano de adaptação das empresas aderentes a normas ambientais imperativas, dentro da qual estas ficam à margem dos referenciais de fiscalização decorrentes das disposições legais sobre a matéria, que são substituídos por referenciais definidos contratualmente. Em síntese, são contratos que envolvem a concertação do âmbito da aplicação de normas administrativas de polícia, designadamente de carácter sancionatório que implicam a sua não aplicação, pelo período definido contratualmente, às empresas contratantes.
Num ordenamento jurídico como o português, que consagra de forma ampla o princípio da autonomia pública contratual, haverá que fazer um esforço de compatibilização entre as figuras contratuais e os princípios e normas gerais em vigor. Esta tarefa resulta ainda mais justificada perante a manifesta dificuldade em enquadrar os contratos ambientais dentro dos princípios sobre os quais o nosso ordenamento jurídico se estrutura e confere unidade sistemática para o Direito do Ambiente: nem nos artigos 9.º/d) e 66.º da CRP, nem no artigo 3.º da LBA, se acolhe a ideia de que o desenvolvimento da política ambiental deve procurar e passar pela concertação com os agentes privados responsáveis pela poluição, maxime, com as empresas industriais poluentes. Não obstante, é possível acolher um “princípio da Concertação”.
Desde logo, ao nível da CRP, o papel que é atribuído à concertação social na elaboração e implementação de planos de desenvolvimento económico e social no seu artigo 90.º, que inclui a defesa do ambiente entre os possíveis objectivos dos planos (v.g., os primeiros “acordos voluntários” de adaptação à legislação ambiental vigente celebrados em 1994, surgiram na sequência do “acordo global” em matéria de ambiente e desenvolvimento sustentável celebrado entre o Governo, a CAP e a CIP). A própria LBA, apesar de não acolher o princípio da concertação no elenco dos princípios específicos constantes do artigo 3.º, consagra expressamente a figura dos “contratos-programa” no seu artigo 35.º, estabelecendo que o Governo pode celebrá-los com vista a reduzir gradualmente a carga poluente das actividades poluidoras. O mesmo se pode constatar na consagração legal, através do DL n.º 236/98, das figuras dos contratos de adaptação e promoção ambiental, que prevêem a possibilidade de o Estado contratar com os agentes poluidores um programa no prazo de adaptação ou melhoramento dos seus desempenhos ambientais.
Por fim, resta saber se a forma como o legislador e a Administração concretizam o princípio da concertação, na busca de uma melhoria dos níveis de execução do comando legal imperativo e da eficácia administrativa, se coadunam com as vinculações jurídico-públicas que sobre aqueles impendem.




III. NATUREZA DOS CONTRATOS DE ADAPTAÇÃO AMBIENTAL

No domínio do ambiente, surgem-nos uma série de contratos administrativos que correspondem ao modo normal de actuação da Administração e que aparecem como alternativa à prática de actos administrativos. Nesse sentido, a contratualização tornou-se ainda mais importante na medida em que a preocupação é a de tornar os particulares “cúmplices” da realização do Direito do Ambiente, ao invés de serem “vítimas”.
A Doutrina é consensual ao considerar os contratos de adaptação ambiental como verdadeiros contratos administrativos.
O contrato de adaptação ambiental traduz um acordo de vontades celebrado entre as empresas aderentes e a Administração Pública e, nos termos da lei, produz efeitos jurídicos para ambas as partes. Neste sentido, considera Vasco Pereira da Silva que o contrato de adaptação ambiental é, efectivamente, um contrato administrativo porque apresenta necessariamente como contraente uma autoridade pública e cria direitos e deveres contratuais de Direito Público, dando assim origem á constituição ou à modificação de uma relação jurídica administrativa.
O contrato de adaptação ambiental enquanto contrato administrativo, alicerça-se na ideia de função administrativa e já não do poder administrativo, ou seja, traduz todos os acordos de vontade decorrentes do exercício da função administrativa.
Mark Kirkby define contrato como o acordo de vontades contrapostas, funcionalizadas à criação, modificação ou extinção de relações jurídicas. Partilhando deste entendimento, Duarte Rodrigues da Silva, justifica-o com base na distinção que Sérvulo Correia traça entre contrato e acto administrativo, ou seja, a distinção entre estas duas figuras administrativas reside na estrutura do acto.
No contrato administrativo, as vontades são iguais e surge como requisito de existência a manifestação da vontade do particular.
O acto administrativo pressupõe vontades desiguais uma vez que o poder constitutivo apenas assiste à vontade da Administração, isto é, a vontade do administrado integra a vontade constitutiva da Administração.
Só há contrato, visto que, no caso concreto, a relação jurídica surge da indispensável conjugação de vontades das partes, não tendo servido apenas para criar os requisitos legais para a prática ou para garantir a eficácia de um acto reconduzível à vontade unilateral da Administração.
Não há vontade unilateral da Administração ou acto administrativo quando se verifica que as associações sectoriais podem, a favor das empresas do sector, propor e negociar o conteúdo concreto do plano de adaptação. Esta situação é demonstrativa de que a vontade dos particulares intervém de forma verdadeiramente constitutiva na composição da relação jurídico-administrativa que decorre dos contratos.
As partes negoceiam e, da conjugação das suas vontades produzem-se efeitos jurídicos concretos a que o contrato dá lugar, sendo esses efeitos reciprocamente vinculativos.
Os autores Mark Kirkby, Castro Rangel e Isabel Moreira, qualificam os contratos de adaptação ambiental como contratos administrativos, com base em dois requisitos: são contratos que envolvem o “exercício da função administrativa”, como define Maria João Estorninho; são contratos de Direito Público, cujo objecto se traduz na regulamentação de uma situação de exercício típico da função administrativa.
Os contratos de adaptação ambiental consubstanciam em si, uma forma de exercício de poderes administrativos, em alternativa ao acto administrativo, não havendo dúvidas de que as relações que surgem destes contratos são relações jurídico-administrativas, sujeitas ao Direito Público, pelo que são necessariamente contratos administrativos.

IV. CONTRATOS DE ADAPTAÇÃO AMBIENTAL E CONTRATOS DE PROMOÇÃO AMBIENTAL

Tratam-se de duas modalidades de acordo de vontades no domínio ambiental, que apesar de possuírem objectos diferentes, apresentam similitudes em termos de regime.
Esta matéria é analisada por Vasco Pereira da Silva, que tem em conta os seguintes aspectos: o fim dos sujeitos, o objecto, a fiscalização e as sanções (DL 236/98).
Relativamente ao fim, os contratos de promoção ambiental destinam-se à promoção de melhoria da qualidade da água e da protecção do meio aquático. Têm por objecto, estabelecer regras jurídicas contratuais que vão para além do regime geral, sendo estes mais rigorosos quando estabelecidos por via contratual (artigo 68.º, n.º 1). Por outro lado, os contratos de adaptação ambiental, destinam-se à adaptação da legislação em vigor, procurando a redução da poluição. Neste contrato, o que está em causa é estabelecer um regime gradual e progressivo de adaptação aos critérios que estão estabelecidos na lei (artigo 78.º, n.º 1).
Do ponto de vista dos sujeitos, há que distinguir os sujeitos de negociação e celebração do acordo e os sujeitos da relação contratual e o da adesão ao acordo pré-estabelecido, sendo diferentes os sujeitos que intervêm em cada um dos contratos. Os sujeitos de negociação e celebração do acordo em ambos os contratos são por um lado as associações representativas dos sectores e por outro lado o Ministério do Ambiente e o Ministério responsável pelo sector da actividade económica (artigos 68.º, n.º 1 e 78.º, n.º 1).
Uma vez celebrado o contrato típico, a ele pode aderir quaisquer empresas de um determinado sector de actividade económica. Para assegurar a possibilidade de adesão ao contrato, estabelecem-se regras a garantir a necessária publicidade (artigos 68.º, n.º 11 e 78.º, n.º 11).
Quanto ao objecto, o contrato de promoção ambiental tem por conteúdo o estabelecimento de um prazo e a fixação de um calendário nos termos dos quais os particulares se comprometem a seguir “normas de descargas mais exigentes do que as que se encontram estabelecidas na lei em vigor para o sector de actividade e para as empresas aderentes” (artigo 68.º, n.º 3).
Relativamente ao contrato de adaptação ambiental, o mecanismo é idêntico mas o objecto é diferente. Destina-se a promover a adaptação da legislação em vigor, e o que está em causa é um objecto contratual que vai calendarizar a adopção do regime legal pouco exigente (artigo 78.º, n.º 2).
Do ponto de vista da fiscalização e das sanções, no contrato de promoção ambiental, os respectivos planos e calendários passam a constituir os termos de referência para a fiscalização das actividades das empresas em causa. Em caso de desrespeito do plano de promoção ambiental acordado, podem existir sanções (artigo 68.º, n.º 7) e em caso de incumprimento poderá haver exclusão do contrato (artigo 68.º, n.º 8).
Nos contratos de adaptação ambiental, os respectivos planos e o calendário passam a ser aceites “como referência para a fiscalização da actividade das instalações das empresas aderentes relativamente ao cumprimento das suas obrigações ambientais (artigo 78.º, n.º 6). Em caso de desrespeito do acordo, será notificada a empresa, para correcção das faltas cometidas, sob pena de cominação e sanções que podem levar à exclusão do contrato (artigo 78.º, n.º 7 e 8).


V. CRISE DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

A principal razão que explica a existência de contratos no domínio da execução administrativa da política do ambiente, em detrimento da imposição de normas imperativas, encontra-se no elevado défice de execução dos comandos legais nesta matéria, em particular dos que impõem limites máximos de emissões poluentes.
Deste modo, sendo impossível à Administração Pública assegurar por via coactiva o cumprimento dos imperativos legais, tem que optar por tentar assegurar o cumprimento possível. E fá-lo através de uma “derrogação” temporária destes, com o objectivo de, num segundo momento, lograr obter um nível de execução normativa que lhe seria impossível sem ser por recurso à concertação com os agentes poluidores.
Assim, coloca-se a questão de saber se pode a Administração agir, a bem da eficácia administrativa, sem ser com base numa norma habilitante, ou proceder a uma regulação que vá para além do que esta autoriza. E, no que se refere aos contratos, se nos casos em que a utilização da forma contratual implicar necessariamente uma regulação diferente da norma de competência, ainda assim a utilização do contrato é permitida à luz de considerações de eficácia, mesmo que em detrimento do princípio da legalidade, sobretudo, nas situações em que o poder é vinculado quanto ao momento e quanto ao conteúdo e a Administração pretende, contratualmente, dispor de forma diferente ou fazer depender o seu exercício de determinadas contrapartidas do co-contraente particular.
Este fenómeno, que vem sendo designado da Doutrina como uma “crise do princípio da legalidade”, explica-se com base em vários factores. Por um lado, a lei deixou de ter aptidão intrínseca para limitar o papel da Administração Pública a uma mera execução dos seus comandos. Por outro lado, e eficácia postula que a Administração tenha uma margem de autonomia face ao comando legislativo.
Ora, perante a constatação da “crise do princípio da legalidade”, a Doutrina procura formas de compensar a menor legitimação que a lei pode dar num contexto em que, em vez de determinar, passou a programar e a orientar. Por isso mesmo, a consagração legislativa de acordos sobre o exercício do poder administrativo representa não apenas uma exigência do princípio democrático, assim como se afirma como uma conciliação do garantismo e da eficiência da actividade administrativa.
Chegados a esta conclusão, teremos que analisar a conformidade dos contratos de adaptação ambiental que têm sido celebrados com o princípio da legalidade e, bem assim, da suficiência habilitante das respectivas bases normativas: onde falhe a habilitação legal, ou onde esta defina de forma precisa os parâmetros de revogação da situação concreta a operar pela Administração, não pode esta optar pela autodeterminação, sob pena contrariar a CRP.

VI. OS CONTRATOS DE ADAPTAÇÃO AMBIENTAL NA LEGISLAÇÃO PORTUGUESA

O ARTIGO 35.º, N.º 2 DA LBA:

De acordo com Castro Rangel e Isabel Moreira, os contratos previstos no artigo 35.º, n.º 2 apresentam-se como “contratos-programa de redução da carga poluente”.
Importa começar por aferir o potencial habilitante do artigo 35.º, a fim de sabermos se será apto a fundamentar a celebração de contratos cujo objecto se dirige à “derrogação” temporária, ou à suspensão de normas ambientais de polícia. Esta tarefa é importante, na medida em que, se for possível concluir que o preceito habilita a Administração a suspender por via contratual normas que estabeleçam limites máximos de emissões poluentes, então o problema da compatibilidade com o princípio da legalidade estará resolvido.
De acordo com Mark Kirkby, o fraco grau de densidade normativa do preceito impediria a sua operacionalização por força do “princípio da precisão ou determinabilidade das leis”. Com efeito, o artigo 35.º, n.º 2 não contém uma tipificação mínima do conteúdo e efeitos dos contratos-programa que permita sustentar que dele se retira uma norma habilitante, pelo que não reúne os requisitos mínimos exigíveis pelo princípio da legalidade da Administração, na dimensão de reserva absoluta de precedência de lei.
Deste modo, a actuação da Administração Pública por via contratual em que afasta temporariamente as normas ambientais imperativas, será inconstitucional por violação do princípio da tipicidade das formas de lei (Jorge Miranda); de acordo com o pensamento de Sérvulo Correia, enfermam de inconstitucionalidade material, por violação do princípio da legalidade administrativa, as normas jurídicas que concedam poderes discricionários que não respeitem os mínimos exigíveis de determinabilidade dos pressupostos e dos efeitos do direito. Com efeito, o impacto do artigo 35.º, n.º2 seria permitir que através de um acto do poder administrativo se “derrogassem temporariamente” ou que se suspendessem actos legislativos, leis em sentido formal, o que consubstanciaria uma violação do artigo 112.º, n.º 6 da CRP, na medida em que, permitiria que uma fonte secundária – o contrato – dispusesse sobre efeitos de actos com força de lei, ou seja, constituiria uma completa subversão da hierarquia das fontes plasmada na Constituição.
Numa posição oposta, Castro Rangel tem em conta que o licenciamento exprime um poder de controlo inicial e, que simetricamente, a aplicação do complexo de sanções representa o exercício de um poder de controlo final. Poderá então afirmar-se que no capítulo V da LBA garante-se, que numa actividade materialmente policial, que os níveis de poluição se contêm dentro dos limites estabelecidos na lei, pelo que a Administração através da celebração de contratos-programa fica autorizada a tolerar durante certo período de tempo, a emissão, por banda do seu co-contratante, de cargas poluentes que, apesar de progressivamente menores atingirão níveis superiores aos máximos legalmente permitidos.
Assim sendo, os contratos-programa têm um carácter derrogatório que se consubstancia numa legitimação contratual da violação – provisória/transitória e gradativamente menos intensa – dos valores limite de poluição recebidos nas normas jurídicas. No mesmo sentido, Fernanda Maçãs, parece retirar do preceito, o afloramento de um princípio de abertura da via contratual no domínio do ambiente, embora este apenas se refira à figura típica do contrato-programa de redução da carga poluente.

O ARTIGO 40.º, N. 3 DO DL 74/90:

Segundo o ensinamento de Mark Kirkby, resulta da análise do artigo 40.º, n.º 3 do DL 74/90, que a competência atribuída à Administração pela norma transitória material é a de determinar uma entrada em vigor diferida e faseada, para determinados destinatários, das novas normas de descarga (que, nessa medida, não entravam logo em vigor para estes destinatários) e não a de derrogar as normas de polícia ambiental que ela própria (ou outra lei) vem definir, ou seja, a disposição transitória limita-se a suster a entrada em vigor das normas de descarga remetendo para um acto administrativo a definição do seu início de vigência para as empresas já instaladas.
Assim, do ponto de vista do princípio da legalidade, este preceito constituía base normativa suficiente para a celebração de contratos de adaptação ambiental e que o seu conteúdo, desde que respeitasse os limites definidos no referido diploma, não acarretaria a derrogação de normas legais imperativas, porquanto as normas de descarga a que respeitavam não entravam em vigor a não ser no termo da execução do próprio contrato.
O problema consiste em saber se a solução transitória não implicará uma violação do princípio da tipicidade das formas legais, na medida em que, fica totalmente dependente da prática de um acto administrativo ou da celebração de um contrato administrativo, ou por outras palavras, coloca-se a dúvida de saber se estamos perante um caso de um reenvio normativo do legislador para a Administração, no sentido deste executar ou adaptar ao caso concreto alguns dos preceitos da lei, ou se, pelo contrário, é um caso de “elevação do acto administrativo a um escalão legislativo” (Gomes Canotilho), expressamente proibido pelo princípio da tipicidade das formas legais. Se se verificar a primeira das hipóteses, o acto administrativo que determina o prazo de adaptação ambiental e, por essa via, o momento do início de vigência da lei respeitaria a respectiva natureza e hierarquia administrativas, porque estaria apenas a assegurar a plena operatividade da lei. Na segunda hipótese, o artigo 40.º, n.º 3, enfermaria de inconstitucionalidade material, por violação do artigo 112.º, n.º 6 da CRP, dado que estaria a permitir que um acto administrativo integrasse o conteúdo material da própria lei.
No entanto, é o próprio autor que admite que a fronteira da resolução do problema é nebulosa, uma vez que não é inédito que leis remetam para actos administrativos o seu início de vigência, para além do problema da segurança jurídica e da protecção de confiança. É o mesmo autor, porém, que responde ao argumento esgrimido, no sentido da sua negação, porquanto o início de vigência das normas não depender de qualquer acto administrativo, por não resultar incompleta, nem necessitar de qualquer desenvolvimento regulamentar que lhe confira aderência à realidade que se pretendesse conformar. Isso mesmo teria sido possível se fosse a própria lei a determinar um prazo de vacatio legis para as normas de descarga, durante o qual as empresas actuariam de modo a aproximarem-se da legislação ambiental a entrar em vigor em momento posterior, estabelecido por lei, concluindo pela inconstitucionalidade da norma que prevê essa possibilidade.
Assim, na opinião deste autor, este preceito é, efectivamente, inconstitucional, por violação do artigo 112.º, n.º 6 da CRP, pois entende que a determinação do momento de início da vigência de uma lei faz ainda parte do conteúdo “principal” dessa lei, porque tem que ver directamente com os aspectos essenciais relativos aos seus efeitos, embora como diz Duarte Rodrigues da Silva, aquele não se refira ao poder regulamentar, mas à emissão de acto administrativo, na previsão do artigo 40.º, nº 3. Há uma substancial diferença entre o tipo de normas transitórias em apreço e aquelas que fazem depender o início da vigência da lei de regulamentação complementar. Nestes casos, a lei é inexequível por si mesma, carecendo de uma actividade concretizadora a nível administrativo para se tornar operacional. No caso presente, pelo contrário, a disposição transitória tem um efeito verdadeiramente constitutivo, já que a lei seria imediatamente exequível, mas, por efeito daquela, passa a ser a Administração a ter o poder de, integrar na própria lei, determinar o momento em que esta começa a produzir os seus efeitos.
Porém, os contratos de adaptação ambiental que foram celebrados pela Administração com base no DL 74/90, foram muito além daquilo que a Administração estaria habilitada por força do artigo 40.º, n.º 3: por um lado os contratos-quadro permitiram a adesão de qualquer empresa do sector contratualizado, não limitando essa possibilidade às empresas já instaladas à data da entrada em vigor do mesmo diploma; por outro lado, conseguiam um prazo de adaptação das empresas aderentes a um leque alargado de normas ambientais vigentes (normas imperativas em matéria de emissões atmosféricas, resíduos e emissões sonoras) e não apenas às novas normas da qualidade da água que entraram em vigor com o diploma. A este propósito, Fernanda Maçãs refere, sem tomar posição, que o fundamento destes acordos estaria, para alguns autores, na margem de discricionariedade de que goza a Administração para iniciar ou não os procedimentos sancionatórios, pelo que, seria possível sustentar a celebração de quaisquer contratos de adaptação ambiental dispensando a necessidade de encontrarmos uma outra base jurídica habilitante. Em sentido diverso, Mark Kirkby, tendo em conta que as normas ambientais são por regra normas administrativas de polícia do tipo sancionatório, ou seja, normas que, definindo limites máximos de emissões poluentes, tipificam contra-ordenações puníveis com coimas, as autoridades administrativas não estão habilitadas para decidir não aplicar as coimas, nem tão pouco, a vincularem-se ao não exercício temporário desse poder, o que acarretaria a violação do princípio constitucional da inalienabilidade e irrenunciabilidade de poderes públicos.
Deste modo, de acordo com este autor, o regime de invalidade a aplicar seria o da anulabilidade, por vício de violação de lei, de todos os contratos de adaptação ambiental que foram celebrados pela Administração com base no DL 74/90, uma vez que tem objecto passível de acto administrativo.
Em posição contrária à de Mark Kirkby, Fernanda Maçãs defende que, não se pode sequer afirmar que a Administração surge a contratualizar os seus poderes polícia ou a aplicação de sanções, porque não estamos perante acordos que produzam os mesmos efeitos de uma sanção. O que se passa é que a Administração em vez de, por despacho, fixar um prazo de adaptação para cada sector de actividade, nos termos do disposto no artigo 40.º, n.º 3 do DL 74/90, produz o mesmo efeito através da celebração de um contrato ou de um acordo. Por outro lado, o caso em análise, também não se subsume naquelas situações em que o legislador disciplina de tal modo os efeitos pretendidos que a sua produção só é compatível com uma situação unilateral. Desde logo, porque o legislador não enquadra o despacho em causa num procedimento cujos trâmites estejam minuciosamente escritos.
Além do mais também não existem razões de ordem substantiva que sejam de molde a valorar negativamente a participação constitutiva das associações industriais ou das unidades industriais na fixação do referido prazo de adaptação, tendo sobretudo em conta que o horizonte temporal da eficácia dos acordos está delimitado.
Questão diferente era a de saber se a utilização da via contratual dispensava a emanação do referido despacho. E a resposta não pode deixar de ser negativa dada a eficácia bilateral dos acordos: só ficariam vinculadas as partes contratantes e as empresas posteriormente aderentes. Assim sendo, seria necessária a emanação do despacho com vista a vincular os não aderentes e aqueles que não cumprissem os acordos, e que viessem a ser desvinculados dos mesmos.

O ARTIGO 17.º, N.º 4 DO DL 352/90

Relativamente ao DL 352/90 tratando-se de fixar o início de vigência de normas de natureza regulamentar, opina Mark Kirkby, no sentido de não haver qualquer problema quanto a esta possibilidade, por não se tratar do desvirtuar de norma de natureza legal. Ou seja, a grande e fundamental diferença relativamente ao diploma anterior reside no facto de no presente, as normas que estabelecem os valores limite de emissões e cuja violação envolve uma contra-ordenação, são normas de natureza regulamentar, o que significa que o legislador qualifica expressamente como de natureza infra-legal as matérias que vão ser objecto pelo contrato-programa previsto no artigo 17.º. Esta norma estabelece um prazo de adaptação de cinco anos às disposições da referida portaria e atribui competência aos referidos ministros para prorrogarem este prazo por via contratual. Desta forma, não está o contrato a integrar o conteúdo da própria lei mas sim, quando muito, o conteúdo da portaria que vier a ser emanada. De acordo com este autor, será esta uma boa forma de fundamentar a celebração de contratos de adaptação ambiental.
Contra esta posição, Duarte Rodrigues Silva, interpreta o preceito como referindo-se não apenas à lei, em sento formal, mas a qualquer norma jurídica, englobando dessa forma os regulamentos, fundando-se esta posição na diferença de hierarquia entre regulamento e acto ou contrato administrativo.
Perante esta questão, o referido autor refere-nos que parece ter razão quem admita essa extensão. Isto porque, se se aplicarem aos regulamentos os mesmos princípios e regras relativos às leis, quando se estiver perante falta de normas específicas que versem sobre a interpretação, integração e validade, uma vez que os actos administrativos devem obediência ao “bloco legal”, também deverão obediência aos regulamentos administrativos. Não obstante diferente natureza entre lei e regulamento, o problema situa-se nos planos orgânico e formal, pelo que qualquer motivo que pudesse levar o legislador a preferir que as normas sobre emissões fossem de natureza regulamentar, estaria ligada ao facto de ser a Administração, que mais próxima se encontra da realidade, a elaborar essas normas. No entanto, continuaria a tratar-se de normas jurídicas com o seu carácter geral e abstracto.
Esta leitura, porém, não impede ao que se julga, que uma lei permita que um acto de hierarquia inferior a um regulamento o modifique. Se o problema fosse um regulamento prever que um acto o modificasse pareceria que essa solução seria de repudiar. Mas, do que se trata é de uma lei determinar que um contrato prorrogue por mais cinco anos a determinação da vacatio legis de cinco anos dos regulamentos que versassem sobre as normas de emissão. Desta forma, julga-se que ficou demonstrado a inexistência de qualquer inconstitucionalidade do artigo 17.º, n.º 4 do DL 352/90.

ARTIGO 78.º DO DL 236/98

Tendo em conta a posição de Duarte Rodrigues Silva, o que o artigo 78.º permite, é que, por intermédio de contrato, a Administração permita uma derrogação a preceitos normativos que já entraram em vigor. Ainda que o artigo se encontre sistematicamente inserido no capítulo referente às disposições finais e transitórias, não parece ter muita eficácia nesse sentido, pois é a letra que indicia a adaptação à legislação em vigor – artigo 78.º, n.º 2, em lado nenhum se estipulando que essas normas não estariam em vigor. Mais do que modificar, o que através desta disposição se permite, é revogar, ou antes derrogar normas jurídicas de natureza legislativa, por intermédio de contratos administrativos, o que é de repudiar, dada a concepção que se tem da Constituição e do princípio da legalidade. Por estes motivos é, para o autor, ainda mais evidente a inconstitucionalidade desta norma.
Na opinião de Mark Kirkby, tendo em conta o artigo 78.º, n.ºs 1,3 e 6 do diploma, parece decorrer uma base habilitante para que, por via contratual, se possam isentar as empresas aderentes, durante o período de adaptação, do cumprimento de quaisquer normas imperativas que estejam em vigor, o que se traduziria numa inconstitucionalidade por violação do princípio da tipicidade das formas de lei. No fundo, o presente diploma pretenderia, sem revogar quaisquer normas ambientais e sem hetero-deslegalizar a matéria constante noutros diplomas legais, habilitar a Administração a suspender a todo o tempo os seus efeitos através de contrato administrativo. Mas, que dizer da habilitação que aqui se consagra, de se contratualizar um prazo e um calendário de adaptação à nova legislação substantiva que entra em vigor com o “novo” diploma? É que no artigo 40.º, n.º 3 do DL 74/90, as novas normas ambientais não chegavam a entrar em vigor, visto que o referido preceito fazia depender o sei início de vigência de um acto administrativo a praticar pelo Director-Geral do Ambiente e, por isso, seria inconstitucional pois delegava neste a faculdade de com efeitos externos, integrar o conteúdo do acto legislativo. Ora, a presente situação é ainda mais grave, porquanto as “novas” normas do diploma entram plenamente em vigor findo o prazo de vacatio legis, pelo que habilita a Administração, por via contratual, a suspender as normas que ela própria veio a consagrar, violando assim o artigo 112.º, n.º 6 da CRP.
Este mesmo autor não aceita o argumento de se poder fazer uma interpretação restritiva do preceito no sentido de concluir que o objecto dos contratos se limitaria à contratualização de um plano de redução das emissões poluentes, no respeito pelo quadro legal vigente.
Vasco Pereira da Silva critica o argumento de Fernanda Maçãs ao referir que estaríamos perante um contrato com objecto passível de acto administrativo, na medida em que, a ilegalidade não surge por ser um contrato (negócio jurídico) ou um acto administrativo (decisão unilateral) mas por afastar um regime legal violando regras constitucionais. Outro argumento de carácter formalístico que é criticado por este autor seria o reconduzir a um contrato que derroga a lei ao abrigo de uma autorização que ela própria é legal: é a própria CRP a proibir a derrogação de actos normativos, pelo que se poderia considerar que se estava perante uma norma inconstitucional.
No entanto, este autor embora concordando com Mark Kirkby no sentido em que só poderiam existir contratos de adaptação ambiental onde houvesse uma situação de indeterminação legislativa, considera possível ir um pouco mais longe.
Assim sendo, a solução a encontrar deve antes partir de uma análise material dos valores que aqui se defrontam: por um lado, os princípios da constitucionalidade, da legalidade e da tipicidade das formas de lei; por outro lado, o da eficácia da realização da política ambiental pela via contratual, o da participação e colaboração dos particulares no exercício da administração do ambiente e o da tutela da confiança dos particulares, quando se verifique alteração dos padrões decisórios da Administração em matéria ambiental.
Deste modo, para além da admissibilidade de celebração de contratos de adaptação ambiental no domínio correspondente à margem de apreciação ou de decisão por parte da Administração, o autor afigura como possível, considerar autorizados, no limite, os contratos de adaptação ambiental que se afastem de limites legais, a título excepcional, desde que isso seja susceptível de encontrar cabimento na previsão legislativa e, que não corresponda a uma situação de “fraude à Constituição” ou “fraude à lei”, nem coloque em causa os princípios fundamentais da actuação administrativa (v.g., igualdade, proporcionalidade, imparcialidade).
Mas isso deveria ainda ficar dependente de duas outras condições: a de que fosse razoável considerar que a lei fixadora de limites consagrava dois regimes jurídicos, o geral, imediatamente aplicável e o especial, apenas parcialmente determinado pela lei (apesar de não poder ser nunca uma “norma em branco”), cuja aplicação ficaria dependente da celebração de contrato administrativo; e a de que esse “regime especial”, relativamente indeterminado, apesar da margem de decisão conferida à Administração, estaria sempre limitado pelas regras de competência, de fim e pelos princípios fundamentais da actividade administrativa constitucionalmente garantidos (artigo 266.º da CRP e artigo 3.º do CPA). Verificadas estas três condições, no limite, este autor, considera a admissibilidade dos contratos de adaptação ambiental no ordenamento português. Pelo que, fazendo uma tal interpretação “conforme à Constituição” das disposições da Lei de Qualidade da Água, talvez seja ainda possível “salvar” os contratos de adaptação ambiental nela previstos (ou, pelo menos, alguns deles).


VII. CONCLUSÃO

O tema teve como base de discussão a confrontação de valores, onde por um lado, tendo em conta os princípios de constitucionalidade, de legalidade e de tipicidade se determina a inconstitucionalidade dos contratos de adaptação ambiental na maioria dos diplomas citados face ao artigo 112.º, n.º 6 da CRP; e por outro lado tendo em consideração os princípios de eficácia da realização da política ambiental pela via contratual, da participação e da colaboração dos particulares no exercício da administração do ambiente, e o de tutela da confiança dos particulares face às alterações dos padrões decisórios da Administração em matéria ambiental, determina-se a constitucionalidade daqueles contratos relativamente àquele preceito.
Tendo a consciência de que a maior parte da Doutrina tende para a primeira solução, considera-se ser possível uma abordagem sobre a constitucionalidade dos contratos de adaptação ambiental face a um fenómeno crescente de “crise do princípio da legalidade”.
Verifica-se que nos diversos diplomas que se debruçam sobre estes contratos, vários são os argumentos a favor da constitucionalidade.
Assim, relativamente ao artigo 35.º, n.º 2 da LBA, Castro Rangel considera que o poder de controlo da Administração no procedimento de licença, justifica um carácter derrogatório dos “contratos-programa”.
Por outro lado, analisando o artigo 40.º, n.º 3 do DL 74/90, posteriormente revogado pelo DL 236/98, pode-se dizer que, ao contrário do ensinamento de Mark Kirkby, Fernanda Maçãs refere que não pode sequer afirmar-se que a Administração surja a contratualizar os seus poderes de polícia ou a aplicação de sanções pelo simples facto de não estarmos perante acordos que produzam os mesmos efeitos de uma sanção, na medida em que, a Administração em vez de fixar actividade produz o mesmo efeito da celebração de um contrato ou de um acordo.
Relativamente ao artigo 17.º, n.º 4 do DL 352/90, a Doutrina é unânime quanto à sua constitucionalidade embora a fundamente com argumentos distintos: por um lado, Mark Kirkby, refere-nos que neste diploma o legislador qualifica expressamente a natureza infra-legal das matérias que vão ser objecto pelo contrato-programa, ou seja, aqui o contrato não integra o conteúdo da própria lei mas sim o conteúdo da portaria que vier a ser emanada; por outro lado, Duarte Rodrigues Silva, seguindo o ensinamento de João Caupers, interpreta o preceito como referindo-se não apenas à lei em sentido formal, mas a qualquer norma jurídica, englobando os regulamentos administrativos, pelo que se admite que uma lei permita que um acto de hierarquia inferior a um regulamento o modifique.
Por fim, tendo em conta o artigo 78.º do DL 236/98, é ainda possível, de acordo com Vasco Pereira da Silva, considerar autorizados, no limite, os contratos de adaptação ambiental que se afastem de limites legais, a título excepcional, e mediante algumas condições.
Em conclusão, podemos dizer em consonância com Vasco Pereira da Silva que, no limite, é possível fazer uma interpretação “conforma à Constituição” ou “à lei” no que respeita à admissibilidade dos contratos de adaptação ambiental no ordenamento jurídico português, tendo ainda em consideração, como defende Fernanda Maçãs, que os acordos podem ser um meio de efectivação da legislação ambiental (princípio da eficácia), conjugada com a necessidade de efectivação do regime de licenciamento, pela execução do princípio do poluidor-pagador (face à situação de concorrência desleal dos não aderentes), e com o reforço do papel de fiscalização e de inspecção permitindo, em última análise, um diagnóstico actualizado dos sectores industriais no que respeita ao cumprimento da legislação ambiental.






quarta-feira, 27 de maio de 2009

Novo regime de Responsabilidade Ambiental

Novo regime da Responsabilidade Ambiental

Entrou em vigor no dia 1 de Agosto de 2008 o Decreto-lei n.º 147/2008, de 29 de Julho que estabelece o regime jurídico da responsabilidade por danos ambientais. Este novo regime não se aplica aos danos causados por quaisquer emissões, acontecimentos ou incidentes, anteriores a esta data, nem aos danos causados por quaisquer emissões, acontecimentos ou incidentes que ocorrem após a entrada em vigor do diploma mas que decorram de uma actividade específica realizadas e concluída antes da referida data.
Este decreto-lei transpõe a Directiva n.º 2034/35/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Abril de 2004 com alterações introduzidas pela Directiva n.º 2006/21/CE, do Parlamento e do Conselho, desenvolvendo a Lei de Bases do Ambiente e reflecte o princípio do “poluidor-pagador”.
Este regime e o princípio de responsabilização (artigo 3.º h) da Lei de Bases do Ambiente) é fundamental ao lado do princípio da prevenção, pois ao atribuir direitos aos particulares, constitui um mecanismo económica e ambientalmente eficiente pois os particulares, uma vez que dotados de direitos indemnizatórios, tornam-se “zeladores” do ambiente.
Salienta-se os seguintes pontos do regime:
- Âmbito de aplicação (artigo 2.º): aplica-se aos danos ambientais, bem como às ameaças iminentes desses danos causados no exercício de uma actividade económica, pública ou privada, lucrativa ou não. Exclui-se a responsabilidade administrativa pela prevenção e reparação de danos ambientais quando estes ou ameaças iminentes sejam causados por actos de conflito armado, hostilidades, guerra civil ou insurreição; em consequência de fenómenos naturais imprevisíveis ou inevitáveis; quando os actos se destinem à defesa nacional ou segurança internacional e quando o único objectivo das actividades seja a protecção contra catástrofes naturais. O referido decreto-lei não tem aplicação, também, quando a responsabilidade seja abrangida pelo âmbito de aplicação de alguma convenção ou instrumento internacional, enumerados nos anexos I e II, respectivamente.
- Responsabilidade solidária entre as Pessoas Colectivas e respectivos directores, gerentes ou administradores (artigo3.º) se a actividade lesiva for imputável à pessoa colectiva. A responsabilidade ambiental estende-se igualmente à sociedade-mãe ou dominante nos casos de grupos de empresas ou relações de domínio.
- Responsabilidade solidária entre comparticipantes (artigo 4.º) – se a responsabilidade recair sobre várias pessoas, todas respondem solidariamente, mesmo que haja culpa de alguma ou algumas, com possibilidade de exercício de direito de regresso na medida das respectivas culpas.
- Nexo de causalidade (artigo 5.º) assenta em critérios de verosimilhança e de probabilidade de o facto danoso ser apto a produzir a lesão verificada.
- Regime de Responsabilidade Civil subjectiva e objectiva (artigos 7.º a 10.º) – traduz a ideia que os operadores-poluidores indemnizam os indivíduos lesados. Quem ofender direitos ou interesses alheios através da lesão de um componente ambiental, no exercício de uma actividade económica enumerada no anexo III, nomeadamente aquelas que necessitam de licença ambiental, de gestão de resíduos, ou relativas a substancias perigosas, ou com descargas para a água, é obrigado a reparar os danos causados, independentemente da existência de culpa (artigo 7.º). Deste modo, sempre que haja qualquer lesão ambiental no exercício das referidas actividades económicas, o operador é responsável.
Em caso de culpa, há sempre responsabilização ainda que não seja no exercício das referidas actividades económicas (artigo 8.º).
A reparação pode ser reduzidas ou atenuada quando um facto culposo do lesado concorreu para a produção ou agravamento do resultado (artigo 9.º).
Caso os danos referidos sejam prevenidos ou reparados nos termos do capítulo III, os lesados não podem exigir qualquer reparação ou indemnização (artigo 10.º n.º1).
- É criado um regime de Responsabilidade Administrativa pela prevenção e reparação de danos ambientais. Este tipo de responsabilidade traduz-se na prevenção ou reparação dos danos causados ao ambiente perante toda a colectividade. Assim, o operador responsabilizado, subjectiva ou objectivamente, é obrigado a adoptar medidas de prevenção e reparação dos danos ou ameaças causados (artigo 12.º), sem prejuízo da responsabilidade a que haja lugar nos termos dos artigos 7.º e 8.º. Estas medidas devem ser tomadas imediatamente (artigo 15.º n.º1b), sendo fixadas pela autoridade competente, a Agencia Portuguesa para o Ambiente (artigo 16.º n.º2 e 29.º). Os custos são suportados pelo operador (artigo 19.º), excepto nas situações do artigo 20.º
- Impõe o cumprimento de obrigações de informação perante autoridades competentes quando exista um dano ambiental ou a sua verificação seja iminente.
- Obrigação de constituição de garantias financeiras que permite assumir a responsabilidade ambiental inerente à actividade desenvolvida. Os operadores que exerçam as actividades ocupacionais enumeradas no anexo III constituem obrigatoriamente uma ou mais garantias financeiras próprias e autónomas, alternativas ou complementares entre si, que lhes permitam assumir a responsabilidade ambiental inerente à actividade por si desenvolvida (artigo 22.º). A constituição destas garantias só será exigível a partir de 2010 e sobre as mesmas incidirá uma taxa de montante máximo de 1% destinada ao Fundo de Intervenção Ambiental (que suporta os custos de intervenção publica e de reparação de danos ambientais, criado pela Lei n.º 50/2006, de 20 de Agosto e regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 150/2008 de 30 de Julho.
- Prevê aplicação de coimas e sanções acessórias (artigo 26.º e 27.º), nomeadamente nos casos em que não se cumpre a obrigação de prestação de informações.

A ideia de responsabilidade por danos ambientais e o princípio do poluidor-pagador, já existia à luz do direito português embora sem a concretização, regulamentação e o pormenor que este regime traz.
Desde de logo como princípio específico do direito do ambiente na alínea a) “Da prevenção: as actuações com efeitos imediatos ou a prazo no ambiente devem ser consideradas de forma antecipativa, reduzindo ou eliminando as causas, prioritariamente à correcção dos efeitos dessas acções ou actividades susceptíveis de alterarem a qualidade do ambiente, sendo o poluidor obrigado a corrigir ou recuperar o ambiente, suportando os encargos daí resultantes, não lhe sendo permitido continuar a acção poluente” e alínea h) do artigo 3.º da Lei de Bases do Ambiente “Da responsabilização: aponta para a assunção pelos agentes das consequências, para terceiros, da sua acção, directa ou indirecta, sobre os recursos naturais”. Nesta disposição já se enquadraria não só as situações de danos efectivos mas também as situações de risco e as medidas preventivas funcionalmente dirigidas a evitar os danos.
O princípio da responsabilização por danos ao ambiente tem dignidade constitucional, no artigo 52.º que se concretizava nos artigos 22.º e 23.º da Lei da Acção Popular, e ainda no artigo 41.º e 48.º da Lei de Bases do Ambiente. Estas consagrações eram insuficientes e incompletas daí a necessidade deste novo regime. Com o novo regime clarificou-se a questão do nexo de causalidade (artigo 5.º), do concurso de imputações (artigo 10.º), delimitação do âmbito de aplicação das normas (artigo 2.º) e o cumprimento da obrigação de prestar informação.
Em relação ao princípio do poluidor-pagador, este princípio que nos diz que cabe ao poluidor suportar os custos económicos da poluição que produza, distingue-se do princípio da responsabilidade por danos ambientais por não se limitar à reparação de danos, mas estar mais vocacionado para a precaução, prevenção e redistribuição dos custos da poluição – é um princípio que actua antes dos danos terem ocorrido.
Concluindo, apesar de essencial, este regime de responsabilidade civil não pode ser instrumento exclusivo ao serviço da protecção do ambiente. Para muitos poluidores as indemnizações constituem apenas mais um custo de protecção e continuam a obter benefícios com as suas actividades. A protecção do ambiente deve, sempre que possível, ancorar-se em instrumentos de cariz preventivo, como por exemplo, a avaliação de impacto ambiental.

Rede Natura 2000

A rede Natura 2000 tem por “objectivo contribuir para assegurar a biodiversidade através da conservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens” no território da União Europeia. Esta política de conservação da naturesa fundamenta-se em dois documentos: a Directiva do Conselho 79/409/CEE relativa à protecção das aves selvagens (conhecida por Directiva das Aves) adoptada em Abril de 1979 e a Directiva do Conselho 92/43/CEE relativa a conservação dos habitats naturais e da fauna e flora selvagens (conhecida por "Directiva Habitats") adoptada em Maio de 1992. Nestas áreas é fundamentalmente preservado a conservação de determinados habitats e espécies, devendo as actividades humanas ser compatíveis com os valores naturais em causas, onde se pondera uma gestão sustentável entre as exigências sociais, económicas e culturais, e as particularidades do ponto de vista ecológico.
As referidas áreas podem ser classificadas como:
• Zonas de Protecção Especial (ZPE) - criadas ao abrigo da Directiva Aves2 e que se destinam essencialmente a garantir a conservação das espécies de aves, e seus habitats (listadas no anexo I da Directiva) e das espécies de aves migratórias (não referidas no anexo I) e que ocorram de forma regular;
• Zonas Especiais de Conservação (ZEC) – criadas ao abrigo da Directiva Habitats2, com o objectivo expresso de contribuir para assegurar a biodiversidade, através da conservação dos habitats naturais e seminaturais (anexo I da Directiva) e dos habitats de espécies da flora e da fauna selvagens (anexo II da Directiva) considerados ameaçados no espaço da União Europeia. Para os efeitos do Plano Sectorial da Rede Natura 2000, consideram-se as áreas classificadas, nas fases intermédias do processo, ou seja os Sítios da Lista Nacional e os Sítios de Importância Comunitária.

No território continental estão classificadas 29 ZPE e 60 Sítios (7 dos quais foram já designados como Sítios de Importância Comunitária (SIC) para a Região Biogeográfica Atlântica),
encontrando-se em processo de classificação duas novas ZPE, Monchique e Caldeirão, cuja área
é coincidente com a dos respectivos Sítios da Lista Nacional. Estas áreas classificadas abrangem uma superfície total terrestre de 1.820978,19 ha, representando cerca de 20,47% do território do Continente.
O Plano Sectorial para a Rede Natura 2000 (PSRD 2000) aplica-se à Administração Pública, não vinculando directamente os particulares. Dele se extraem orientações estratégicas e normas programáticas vinculativas da actuação da Administração central e local.
Os principais objectivos do Plano Sectorial são os seguintes:
• Estabelecer um conjunto de orientações estratégicas para a gestão do território das ZPE e Sítios considerando os valores naturais que nele ocorrem, com vista a garantir a sua conservação a médio e longo prazo;
• Estabelecer o regime de salvaguarda dos recursos e valores naturais das ZPE e Sítios, orientando a uma macro-escala a fixação dos usos e o regime de gestão compatíveis com a utilização sustentável do território a efectuar, posteriormente, através da inserção das normas e orientações nos instrumentos de gestão territorial que vinculam directamente os particulares (planos municipais e planos especiais de ordenamento do território);
• Representar cartograficamente, em função dos dados disponíveis, a distribuição dos habitats naturais e semi-naturais e das espécies da flora e da fauna, presentes no Sítios e ZPE;
• Estabelecer directrizes para o zonamento das áreas em função das respectivas características e prioridades de conservação, a definir nos planos de ordenamento que vinculam as entidades privadas, nos quais deverão ser fixados e zonados os usos do território e os regimes de gestão, com vista à utilização sustentável do território;
• Definir as medidas que garantam a valorização e a manutenção num estado de conservação favorável dos habitats e espécies, bem como fornecer a tipologia das restrições ao uso do solo, tendo em conta a distribuição dos habitats a proteger;
• Fornecer orientações sobre a inserção (a efectuar no prazo máximo de seis anos) em plano municipal ou especial de ordenamento do território das medidas e restrições mencionadas nas alíneas anteriores, na medida em que são estes os planos vinculativos dos particulares;
• Definir, para cada Sítio e ZPE, os projectos a sujeitar a avaliação de impacto ambiental ou a análise de incidências ambientais.


A maior parte dos sítios que integrarão a Rede Natura 2000 dispõem de um estatuto de protecção. Contudo, este facto não significa que o processo fique concluído ou que a rede Natura 2000 esteja de pedra e cal até à eternidade. Torna-se necessário manter a dinâmica do processo, de modo a poder ajustá-lo permanentemente ao relativo êxito ou insucesso das medidas tomadas. Assim, e tal como acontece com a "Directiva Aves", é muito provável que ainda se adicionem sítios à Rede Natura 2000 caso se mantenha o declínio de espécies ou habitats. Finalmente, o sucesso da Rede Natura 2000, de modo a atingir os objectivos expressos na Directiva, depende da responsabilidade conjunta da Comissão e dos Estados-Membros.

Cláudia Cordeiro, nº 14600

Deferimento tácito nos procedimentos em matéria de ambiente

Antes de mais, convém dizer que este texto não representa propriamente um trabalho, mas sim um mero comentário relativo à consagração da figura do deferimento tácito no âmbito dos procedimentos administrativos ambientais portugueses, centrando-se esta análise no procedimento de avaliação de impacte ( ou impacto) ambiental, consagrado no Decreto-Lei 69/2000. Este comentário irá ter em conta, na medida do possível, as perspectivas do Direito Comunitário, do Direito Administrativo geral e do Direito do Ambiente.
Ainda uma nota formal. Sempre que se refere neste texto Figueiredo Dias está-se a ter em conta a obra conjunta elaborada por um conjunto de pessoas, do qual este autor fez parte, que está indicada na bibliografia deste trabalho.



Noção de deferimento tácito, a sua natureza e a sua consagração no Direito Administrativo geral

Avançar com uma noção de deferimento tácito implica ter já em conta o entendimento que se tem relativamente à sua natureza. Ou seja, o apuramento da sua natureza deve ser prévio à sua definição.
Diga-se só que o deferimento tácito é um efeito atribuido pela lei, positivo em relação à pretensão de um particular, em caso de silêncio da Administração perante esse mesmo pedido, depois do decurso de um prazo fixado para a decisão.
O escopo desta figura é, como se vê, superar a inércia dos orgãos da Administração perante solicitações de particulares ( João Miranda), valorando-se este silêncio como manifestação tácita da vontade da Administração num sentido positivo para o particular ( Freitas do Amaral). Paralelamente, ao silêncio também se pode atribuir o valor de acto tácito negativo, ou seja, desfavorável à pretensão do particular. É o indeferimento tácito, que se deve considerar, ( como se verá a seu tempo), ser a regra geral relativamente aos efeitos a atribuir ao silêncio da Administração. O indeferimento tácito terá surgido como forma de habilitar o particular a agir contenciosamente, num tempo em que o nosso contencioso assentava numa lógica actocêntrica ( Vasco Pereira da Silva).

Quanto à natureza jurídica do deferimento tácito existem várias concepções. Assim a figura do deferimento tácito pode ser:
- uma técnica legal de interpretação do silêncio;
- uma presunção;
- um acto administrativo;
- uma ficcão legal de acto administrativo;
- um mero pressuposto do recurso contencioso; ou
- um acto ficcionado.
Bem, certas posições assemelham-se bastante. A tese de que o deferimento tácito é um acto administrativo era já defendida por Marcello Caetano, e teve significativa aderência. De acordo com esta teoria, no acto tácito há uma manifestação de vontade do orgão competente da Administração, na medida em que estes conheçem a lei e sabem que estes exactos efeitos ( do deferimento tácito) se vão produzir.
André Gonçalves Pereira e Rui Machete vêem no deferimento tácito um simples pressuposto para o recurso contencioso. Ao invés de verem no deferimento tácito um acto voluntário do orgão da Administração, associam o decurso do prazo sem decisão a factores como o descuido, o desinteresse, ou incapacidades de vários níveis.
Já Freitas do Amaral discorda destas posições, entendendo que o deferimento tácito deve ser tido como uma ficção legal de acto administrativo, na medida em que, por um lado, a lei trata o acto tácito como acto administrativo para todos os efeitos, não apenas para efeitos de recurso contencioso, por outro lado, não é verdadeiramente acto administrativo porque não há uma conduta voluntária.
João Tiago da Silveira vê no deferimento tácito um acto ficcionado, aproximando-se da posição de Freitas do Amaral.
Também me parece ser esta a visão mais correcta.

Assim se pode partir para a definição de deferimento tácito. De acordo com João Tiago da Silveira o deferimento tácito é “ o acto ficcionado através do qual se concede ao particular, nos casos e condições legalmente previstos, o correspondente à sua pretensão, na sequência do decurso de um lapso temporal sem que a Administração se tenha pronunciado sobre a mesma”.
Normalmente são apontadas, (como pressupostos do deferimento tácito), as seguintes características:
- pretensão inteligível;
- tempestividade;
- legitimidade;
- competência;
- inexistência de decisão expressa;
- actualidade do direito;
- existência de dever legal de decidir ( 9.º/2 CPA);
- falta de decisão no prazo legal.
Alguns autores defendem ainda como pressuposto a legalidade.


O regime do CPA relativo aos actos tácitos e a consagração do deferimento tácito nos procedimentos em matéria de ambiente

No nosso Direito Administrativo a regra geral, relativamente aos efeitos do silêncio, é a do indeferimento tácito, só havendo actos tácitos positivos nos casos expressamente previstos por lei. Esses casos são, essencialmente, os que a doutrina designa de autorizações permissivas ( situações em que o particular dispõe de um direito pré-existente à emissão da autorização, estando apenas o seu exercício condicionado por essa autorização). O artigo 108.º/3 do CPA traz uma exemplificação de matérias abrangidas.
Por outro lado existem as autorizações constitutivas de direitos ou autorizações-licença, em que uma norma legal retira aos particulares certos direitos ou o exercício de faculdades que se contêm nos seus direitos, admitindo-se, porém, que a Administração possa atribuir ao particular o direito que lhe retirou.

Quanto aos casos especialmente previstos de deferimento tácito só nos interessam os contidos em procedimentos em matéria de ambiente.
No procedimento de AIA, (como se observou, regulado no Decreto-Lei 69/2000), ele encontra-se no artigo 19.º/1. Assim, considera-se a DIA como favorável em caso da não comunicação da decisão à entidade licenciadora ou competente para a autorização, após o decurso do prazos aí previstos. Este deferimento tácito será analisado especialmente, mais à frente.
No mesmo diploma ainda se encontram duas normas semelhantes a esta, na medida em que atribuem à falta de decisão após o decurso de um prazo, um efeito favorável à pretensão do particular. As normas são o artigo 11.º/8 e 28.º/7. Quanto ao primeiro, ele diz respeito à proposta ( do particular) de definição do âmbito do EIA, e, assim, na ausência de deliberação no prazo do n.º7 do mesmo artigo, considera-se essa ausência como favorável à proposta apresentada. Como salienta Figueiredo Dias , não se trata aqui propriamente de um deferimento tácito. Também afirma que, uma vez que esta é uma fase facultativa, a consagração desta solução parece razoável. Já o 28.º/7 é merecedor de críticas. Mas, isso resultará da análise do 19.º/1, cujas observações valem para o 28.º/7. De qualquer das formas, convem dizer que este deferimento se situa na fase de pós-avaliação, e estabele que, não tendo havido decisão sobre a conformidade de um projecto de execução com a DIA, no prazo de 50 dias, contados a partir da recepção pela autoridade de AIA da documentação, considera-se que o projecto é conforme.
Em relação ao pedido de dispensa de procedimento de AIA ( artigo 3.º) já vigora a regra do indeferimento tácito ( n.º11).

No regime da prevenção e controlo intergrados da poluição ( Decreto-Lei 173/2008), no procedimento de licença ambiental também se prevê o deferimento tácito, no artigo 17.º. Este deferimento não corresponde ao modelo típico e tradicional de deferimento. De facto, se se atentar na 2ª parte do n.º1 do artigo 17.º, vê-se que, para além dos requisitos normais para se operar o deferimento ( 1ª parte), exige-se a não verificação das causas que podem levar ao indeferimento. Esta solução é estranha. Parece que vem acrescentar como pressuposto do deferimento tácito a legalidade. Já se viu que existe discussão relativamente a esta necessidade ou não de legalidade como pressuposto do deferimento. Parece que a maioria da doutrina não entende necessário este requisito. Defendem esta posição, nomeadamente, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e João Miranda.
Maior problema, quanto a esta solução, resulta do facto de, em relação às alíneas d) a e) do n.º 6 do artigo 16.º do mesmo diploma, haver alguma margem de discricionaridade e apreciação da Administração, levando a que seja um exercício difícil ou quase impossível ( a não ser que haja indícios ou práticas comuns da Administração, como se pode saber que opção irão tomar?) determinar a sua verificação. Isto traz uma insegurança e incerteza altamente desaconselhável porque nem é boa para a Administração, nem para os particulares.
Outra perplexidade resultante deste deferimento tácito é a necessidade da APA emitir certidão comprovativa do decurso do prazo e do consequente deferimento tácito ( artigo 17.º/2). Quanto a isto são de salientar duas coisas. A primeira é verificar que provavelmente, a previsão desta comunicação teve em vista colmatar a incerteza e insegurança criadas pela situação consagrada no 17.º/1, 2ª parte. Segundo, parece-me estranho e não fazer sentido obrigar a Administração a actuar quando ela, por uma razão, ou por outra, não actuou. A licença ambiental é de extrema importância para efeitos de controlo e prevenção ecológica. Impõe-se à Administração um especial dever de agir. Se o orgão da Administração não agiu é porque não teve capacidade ou porque é irresponsável. Vir obrigar a Administração a agir, de modo a reconhecer que não agiu parece-me estranho. Mas, como se viu, em relação ao particular, esta certidão ainda cumpre algumas funções e representa alguma utilidade, nomeadamente para efeitos processuais, sendo que à passagem de certidões corresponde um processo urgente (104.º e seguintes do CPTA).

Relativamente ao Regime de Exercício da Actividade Industrial ( Decreto-Lei 209/2008), o deferimento tácito é logo anunciado no Preâmbulo desse diploma, falando-se num princípio geral do deferimento tácito. Ora, o princípio geral no nosso ordenamento, como se viu é precisamente o contrário, é o do indeferimento tácito.
Prosseguindo, verifica-se que o artigo 25.º/1 desse diploma considera tacitamente deferida a pretensão do particular ( de autorização de instalação de estabelecimento industrial), quando decorrido o prazo para a decisão, e não havendo nenhuma causa de indeferimento, a Administração não se tenha pronunciado. Novamente surge aqui o pressuposto da não verificação das causas de indeferimento. No entanto, pelo menos quanto a estas não se parecem colocar os problemas da sua determinação ( vejam-se as alíneas do n.º 4 do artigo 24.º). Neste deferimento há, tal como no caso do 17.º/2 do Decreto-Lei 173/2008 ( relativo à licença ambiental) , uma obrigação de passagem de certidão. Já se analisou esta questão.
No artigo 31.º, ainda do Decreto-Lei 209/2008, encontra-se também o deferimento tácito do pedido de obtenção de título para exercício de exploração de estabelecimento industrial. Este deferimento surge nos mesmos moldes do presente no artigo 25.º. No entanto, relativamente à questão das causas de indeferimento, encontramos agora, a alínea a) do n.º 6 do artigo 30.º, que é susceptível da mesma crítica feita às alíneas d) a f) do n.º 6 do artigo 16.º do Decreto-Lei 173/2008.
Curioso é que no deferimento previsto no artigo 38.º do mesmo diploma, (que, no geral, é semelhante aos outros), estabele-se uma situação diferente. Quando se menciona no n.º 1 do artigo 38.º, que não se podem verificar as causas de indeferimento, só se faz menção às alíneas b) e c) do n.º 4 do artigo 37.º. Estas alíneas b) e c) não envolvem a tal dificuldade de verificação ( porque não envolvem margem de apreciação da Administração), pelo que ficam sujeitas a este controlo, só se reconhecendo o deferimento ( tácito) se estas causas não se verificarem. Mas, na alínea a) do n.º4 do artigo 37.º prevê-se outra causa de indeferimento, que envolve já a tal dificuldade de verificação, na medida em que implica uma margem de apreciação do orgão da Administração ( veja-se a expressão: “ desde que tais desconformidades tenham relevo suficiente para a não permissão do início de exploração do estabelecimento industrial”).

Também nos artigos 21.º, 27.º e 35.º do Decreto-Lei 214/2008 se estabelecem soluções semelhantes, com algumas variações. Não se percebe o critério utilizado para estabelecer a diferença de tratamento dados aos casos em que há causas de indeferimento que envolvem um juízo de orgão aplicador. De facto, em alguns casos faz-se a excepção desses casos, noutros obriga-se a verificar a sua existência.

Relativamente aos procedimentos relacionados com os Projectos PIN + ( Decreto-Lei 285/2007), prevê-se no artigo 6.º/2 um indeferimento tácito, mas é um indeferimento limitado, na medida em que não afecta necessariamente a sua classificação como PIN, mas, unicamente como PIN + ( artigo 6.º/3).

Analisados alguns procedimentos, deve-se dizer que as soluções consagradas não parecem ser as melhores e estão todas ( ou quase todas) sujeitas à mesma crítica. Na medida em que sejam instrumentos de prevenção de danos ambientais, os procedimentos que consagram deferimentos tácitos não estão de acordo com esse mesmo princípio da prevenção ( artigo 3.º, a) da LBA, 66.º/2, a) da CRP e 174.º/2 do TCE). Por outro lado, também se consagram soluções que vêm limitar um pouco os efeitos reconhecidos ao acto tácito de deferimento.
A análise que se irá seguir servirá, em grande medida, para colmatar as lacunas das observações feitas a estes procedimentos.



Deferimento tácito no regime da AIA e a sua ( des) conformidade com o princípio da prevenção e com a teleologia do próprio procedimento

Prévia a toda a discussão que se irá seguir, está o reconhecimento da natureza jurídica de acto administrativo da decisão de AIA ( tanto das perspectivas orgância, competencial como material). É que, por vezes levantava-se a hipótese de a decisão de AIA ser considerada um parecer na perspectiva da entidade licenciadora. Há autores ( parece ser o caso de Pedro Gonçalves) que entendem que os pareceres vinculativos ( 98.º/1 do CPA) devem ser tidos como verdadeiros actos administrativos, para efeitos, nomeadamente, de contencioso administrativo. Isto tinha relevância porque, à partida, a questão do deferimento tácito só se aplica aos actos e não aos pareceres. Mas, parece consensual que estamos perante um verdadeiro acto administrativo.

O regime da Avaliação de Impacto Ambiental é um instrumento preventivo fundamental da política de ambiente e do ordenamento do território ( primeiro parágrafo do preâmbulo do Decreto-Lei 69/2000), visando promover o desenvolvimento sustentável e a gestão equilibrada dos recursos naturais, através da sujeição de projectos susceptíveis de produzirem efeitos significativos no ambiente ( artigo 1.º/1) a uma avaliação de alguma profundidade, que culmina com uma decisão de conformidade ( sujeita a condicões ou não) ou desconformidade ( 17.º/1), com carácter vinculativo ( parágrafo 4 do preâmbulo e artigo 20.º).

Este regime do deferimento tácito do 19.º/1 suscita muitas dúvidas e muita crítica. Vamos procurar expor algumas.
Conforme diz Figueiredo Dias é um paradoxo prever o deferimento em caso de silêncio da entidade competente para a DIA num regime em que a decisão negativa é sempre vinculativa.
Como vimos, este procedimento e a sujeição a ele deriva de necessidades de controlo, prevenção e antecipação ( basicamente corolários do princípio da prevenção) relativamente a projectos susceptíveis de lesar o meio-ambiente. A previsão do deferimento vem nas palavras de Figueiredo Dias, às quais se adere, subverter por completo a intencionalidade e teleologia do regime legal. Há uma contradição profunda entre a função e razão de ser do procedimento com esta concreta solução.

Relembrando a distinção que se fez entre as autorizações permissivas e autorizações-licença, deve-se enquadrar estes casos na segunda categoria, não devendo considerar-se que o proponente goza de algum direito antes de iniciado o procedimento. De facto, a obrigação de sujeição a AIA representa uma restrição intensa aos direitos de construção e iniciativa económica ( Figueiredo Dias). Assim, de acordo com as regras gerais dos artigos 108.º e 109.º do CPA, estes casos deviam dar origem a um indeferimento tácito e não ao deferimento.

Figueiredo Dias observa ainda que os prazos globais para a decisão podem, em concreto, e face à complexidade de algumas questões, revelar-se insuficientes, o que pode levar a que a Administração, ( face esta necessidade de cumprir os prazos, de forma a não se dar o deferimento tácito), tenha uma “actuação mais célere do que ponderada”.
Assim, conclui-se que esta consagração do deferimento tácito é contrária à regral geral dos efeitos do silêncio, e que ao contrário de outros procedimentos em que poderia haver justificação para a sua consagração, aqui passa-se precisamente o contrário. O princípio da prevenção ( ou da prevenção e precaução, para quem faça a distinção), impõe a realização da AIA e não admite decisões tácitas, que no fundo não são decisões, mas meras ficções.

Os efeitos ( gravosos) do deferimento tácito parecem ser atenuados pelo disposto no artigo 19.º/5. De acordo com este artigo, a decisão ( final) da entidade competente para o licenciamento ou autorização, na sua fundamentação tem em consideração o EIA e os elementos constantes do artigo 17.º/1 ( todos do Decreto-Lei 69/2000). Vasco Pereira da Silva defende uma interpretação conforme à Constituição, que implica que, nos casos em que não há posteriormente a sujeição a licença ambiental, ( não havendo assim uma ponderação dos factores ambientais), o deferimento tácito venha a permitir a decisão da entidade licenciadora, não condicionando o seu conteúdo, e obrigando à ponderação efectiva dos valores e interesses ecológicos. Isto, sob pena de nulidade, recorrendo este Professor ao artigo 20.º/3 do Decreto-Lei 69/2000.
O problema é que, em muitas situações, o orgão licenciador não tem habilitações técnicas para, com competência e qualidade, proceder a essa avaliação. As entidades de AIA é que são especializadas nesta matéria e possuem habilitações para tal.
O que revela é o facto do deferimento tácito não afastar por completo as considerações produzidas no procedimento de AIA, ainda que insuficientes.



O deferimento tácito em procedimento de AIA e a sua ( des) conformidade com o Direito e Jurisprudência Comunitária

Pode-se começar por lembrar que o Direito Comunitário também consagra o princípio da prevenção em matéria de ambiente ( artigo 174.º/2 TCE), e, assim, valem aqui as ideias formuladas a propósito da análise feita no ponto anterior deste texto. Lembre-se ainda que é este princípio que está na base da criação do regime de AIA.

O Decreto-Lei 69/2000 foi elaborado de modo a efectuar a transposição da uma Directiva Comunitária ( Directiva 85/337/CEE, alterada mais recentemente pela Directiva 2003/35/CE). Essa Directiva impunha aos Estados a necessidade tomarem as “disposições necessárias para que, antes de concedida a aprovação, os projectos que possam ter um impacto significativo no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização, sejam submetidos à avaliação dos seus efeitos”( artigo 2.º/1).

A previsão de mecanismos como deferimentos tácitos ( ou instrumentos análogos) foi discutida pelos Tribunais Comunitários e há já uma jurisprudência, minimamente consolidada, que entende que esta previsão é incompatível com as exigências desta e de outras directivas semelhantes.
O Acordão do Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia ( TJCE) de 14/06/2001, ( processo C-230/00) é um exemplo importante desta jurisprudência.
Neste caso havia uma acção de incumprimento da transposição de directivas ( em matéria de ambiente, incluindo a directiva relativa a AIA) por parte do Reino da Bélgica.
Entendia a Comissão que, apesar de cumprida a obrigação ( constante do artigo 2.º da Directiva 85/337/CEE) de imposição de sujeição a autorização em geral, algumas normas das Regiões da Flandres e da Valónia tinham um sistema de concessão tácita de autorizações. De facto, segundo parece, estas Regiões tinham normas que estabeleciam que em primeira instância o silêncio da Administração valia como recusa tácita, mas, em segunda instância ( recurso), ao silêncio, depois de decorrido o prazo legal para a decisão, correspondia uma autorização tácita.
As autoridades belgas alegavam que o campo de aplicação destas normas era muito limitado, sendo reduzido o número de autorizações tácitas e que os orgãos da Administração tinham plena consciência dos efeitos da autorização tácita, agindo como tal de forma o mais diligente possível. Argumentavam ainda que a autorização tácita não implicava uma negligência da autoridade competente, uma vez que o pedido de autorização dava lugar a uma avaliação circunstanciada.
O TJCE não cedeu as estes argumentos e invocou as interpretações feitas por jurisprudência anterior semelhante ( Acordão de 28/02/1991, processo C-360/87; Acordão Linster de 19/09/2000, processo C-287/98, entre outros), nos termos das quais entende que o mecanismo de autorização tácita é incompatível com as disposições das directivas em questão ( incluindo, repita-se, a Directiva 85/337/CEE).

Comparando o caso belga ao caso português percebemos que, provavelmente, estaremos sujeitos a uma acção de incumprimento.
O nosso caso até parece ser mais grave do que o belga, uma vez que naquelas Regiões da Bélgica, o deferimento tácito só ocorria em segunda instância, enquanto que em Portugal ele ocorre logo no início. E se é certo que o indeferimento tácito na primeira instância também não é desejável ( a jurisprudência comunitária parece ser contra actos tácitos positivos ou negativos nesta matéria), não deixa de ser menos grave do que o deferimento, dada a função do procedimento e o próprio princípio da prevenção.


Conclusões


Como se viu existem duas grandes razões que me levam a concluir pela não admissibilidade da previsão do deferimento tácito no procedimento de AIA ( e em geral, tendo em conta as especialidades existentes, a outros procedimentos de licenciamento ou semelhantes). As razões, no entanto, podem reduzir-se a uma, que é o princípio da prevenção, na medida em que é neste princípio que estão baseadas as soluções tomadas pelo Direito Comunitário, e por arrasto, pelo legislador português.
Assim, a previsão deste deferimento é contrária à própria lógica do procedimento em que se insere, sendo contrário, no fundo, à eficaz protecção do ambiente ( na sua vertente preventiva).





Bibliografia:
- “ Verde Cor de Direito- Lições de Direito do Ambiente”- Vasco Pereira da Silva
- “ O deferimento tácito dos actos de licenciamento urbanístico e a intimação judicial para emissão de alvará de licença de construção : comentário ao acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, 1ª secção, de 27 de Fevereiro de 1997”- João Pedro Oliveira Miranda

- “ O deferimento tácito : esboço do regime jurídico do acto tácito positivo na sequência de pedido do particular” - João Tiago Valente Almeida da Silveira

- “ Regime jurídico da avaliação de impacte ambiental em Portugal = Environmental impact assessment law in Portugal” - com. José Eduardo Figueiredo Dias, Maria Alexandra de Sousa Aragão, Maria Ana Barradas Toledo Rolla

A Constituição é Verde por causa da Natureza ou por nossa causa? Concepções para a defesa do Ambiente e consagração constitucional

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Tarefa 8-

O ordenamento do território tem a sua expressão máxima no “Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território” ( PNPOT). Sendo este um instrumento de desenvolvimento territorial, de natureza estratégica e de âmbito nacional: “estabelece as grandes opções com relevância para a organização do território nacional, consubstancia o quadro de referência a considerar na elaboração dos demais instrumentos de gestão territorial [nomeadamente, os PROT e os PDM]”, artigo 26º do Decreto- Lei 380/99, e “ estabelece as opções e as directrizes relativas à conformação do sistema urbano, das redes, das infra-estruturas e equipamentos de interesse nacional, bem como à salvaguarda e valorização das áreas de interesse nacional em termos ambientais, patrimoniais e de desenvolvimento rural”, artigo 28/1 a). O ordenamento do território rege-se assim por princípios gerais, consagrados na Lei 48/98, artigo 5º:
a) Sustentabilidade e solidariedade intergeracional, assegurando a transmissão às gerações futuras de um território e de espaços edificados correctamente ordenados;
b) Economia, assegurando a utilização ponderada e parcimoniosa dos recursos naturais e culturais.
Dos objectivos estratégicos, definidos na Resolução do Conselho de Ministros nº 76/2002, de 11 Abril, destaco a alínea c) “ Salvaguarda e valorizar os recursos naturais e promover a sua utilização sustentável, bem como garantir a protecção dos valores ambientais e do património natural, paisagístico, rural e cultural.”
O Decreto-Lei 380/99 prevê vários tipos de planos, os planos sectoriais, os planos especiais, os regionais, os planos intermunicipais e por último os planos municipais.
Os planos sectoriais, previstos no artigo 35º, tem um âmbito nacional, artigo 36º a) “As opções sectoriais e os objectivos a alcançar no quadro das directrizes nacionais aplicáveis;”, são elaborados pela administração estadual directa ou indirecta, artigo 38º/1.
Os planos especiais de ordenamento do território têm natureza regulamentar e são elaborados pela administração central, artigo 42º/1, e são um meio supletivo de intervenção do Governo. Estes planos podem ser: planos de ordenamento de áreas protegidas, planos de ordenamento de albufeiras e águas públicas, planos de ordenamento da orla costeira ou planos de ordenamento dos estuários, artigo 42/3.
Seguem-se os planos regionais de ordenamento do território, artigo 51º, estes têm âmbito regional e a sua elaboração compete à CCDR, que é determinada por resolução do Conselho de Ministros, artigo 55º.
De âmbito municipal são os planos intermunicipais e os municipais. Os primeiros são um instrumento de desenvolvimento territorial e fazem a articulação entre o plano regional e os planos municipais de ordenamento, nos casos de áreas que precisam de uma coordenação integrada, artigo 60º/1.
Os segundos são “instrumentos de natureza regulamentar, aprovados pelos municípios”, artigo 69º. Os planos municipais podem ser: plano director municipal, artigo 84º, plano de urbanização, artigo 87º e plano de pormenor, artigo 90º.
O ordenamento do território é concretizado através de todos estes planos, e é da sua articulação com o ambiente que se atinge a utilização racional dos recursos naturais e infra-estruturais. Esta articulação tem assento constitucional, artigo 62º/2 a) CRP, todos têm direito a um ambiente saudável e ecologicamente equilibrado, sendo dever do Estado preservar o meio ambiente, promover a sua gestão e conservação através do ordenamento do território de forma a aproveitar de forma racional os recursos naturais e acautelar a sua renovação.
No que concerne à política ambiental, o seu primeiro objectivo é o desenvolvimento económico e social auto-sustentado e a expansão das áreas urbanas, artigo 4º/ a) da Lei de Bases do Ambiente, o que vêm ao encontro da política dos PEOT, pois estes são instrumentos regulamentares e de orientação, da responsabilidade da Administração Central, que visam criar uma política integrada de ordenamento do território como forma de zelar pelo desenvolvimento económico sem descurar o respeito pelo desenvolvimento ambiental sádio e sustentável.
Para concluir, os planos de ordenamento do território prosseguem a política pública de ambiente de forma a que se articulem o desenvolvimento económico e a preservação do meio ambiente.
Tarefa 8-

O ordenamento do território tem a sua expressão máxima no “Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território” ( PNPOT). Sendo este um instrumento de desenvolvimento territorial, de natureza estratégica e de âmbito nacional: “estabelece as grandes opções com relevância para a organização do território nacional, consubstancia o quadro de referência a considerar na elaboração dos demais instrumentos de gestão territorial [nomeadamente, os PROT e os PDM]”, artigo 26º do Decreto- Lei 380/99, e “ estabelece as opções e as directrizes relativas à conformação do sistema urbano, das redes, das infra-estruturas e equipamentos de interesse nacional, bem como à salvaguarda e valorização das áreas de interesse nacional em termos ambientais, patrimoniais e de desenvolvimento rural”, artigo 28/1 a). O ordenamento do território rege-se assim por princípios gerais, consagrados na Lei 48/98, artigo 5º:
a) Sustentabilidade e solidariedade intergeracional, assegurando a transmissão às gerações futuras de um território e de espaços edificados correctamente ordenados;
b) Economia, assegurando a utilização ponderada e parcimoniosa dos recursos naturais e culturais.
Dos objectivos estratégicos, definidos na Resolução do Conselho de Ministros nº 76/2002, de 11 Abril, destaco a alínea c) “ Salvaguarda e valorizar os recursos naturais e promover a sua utilização sustentável, bem como garantir a protecção dos valores ambientais e do património natural, paisagístico, rural e cultural.”
O Decreto-Lei 380/99 prevê vários tipos de planos, os planos sectoriais, os planos especiais, os regionais, os planos intermunicipais e por último os planos municipais.
Os planos sectoriais, previstos no artigo 35º, tem um âmbito nacional, artigo 36º a) “As opções sectoriais e os objectivos a alcançar no quadro das directrizes nacionais aplicáveis;”, são elaborados pela administração estadual directa ou indirecta, artigo 38º/1.
Os planos especiais de ordenamento do território têm natureza regulamentar e são elaborados pela administração central, artigo 42º/1, e são um meio supletivo de intervenção do Governo. Estes planos podem ser: planos de ordenamento de áreas protegidas, planos de ordenamento de albufeiras e águas públicas, planos de ordenamento da orla costeira ou planos de ordenamento dos estuários, artigo 42/3.
Seguem-se os planos regionais de ordenamento do território, artigo 51º, estes têm âmbito regional e a sua elaboração compete à CCDR, que é determinada por resolução do Conselho de Ministros, artigo 55º.
De âmbito municipal são os planos intermunicipais e os municipais. Os primeiros são um instrumento de desenvolvimento territorial e fazem a articulação entre o plano regional e os planos municipais de ordenamento, nos casos de áreas que precisam de uma coordenação integrada, artigo 60º/1.
Os segundos são “instrumentos de natureza regulamentar, aprovados pelos municípios”, artigo 69º. Os planos municipais podem ser: plano director municipal, artigo 84º, plano de urbanização, artigo 87º e plano de pormenor, artigo 90º.
O ordenamento do território é concretizado através de todos estes planos, e é da sua articulação com o ambiente que se atinge a utilização racional dos recursos naturais e infra-estruturais. Esta articulação tem assento constitucional, artigo 62º/2 a) CRP, todos têm direito a um ambiente saudável e ecologicamente equilibrado, sendo dever do Estado preservar o meio ambiente, promover a sua gestão e conservação através do ordenamento do território de forma a aproveitar de forma racional os recursos naturais e acautelar a sua renovação.
No que concerne à política ambiental, o seu primeiro objectivo é o desenvolvimento económico e social auto-sustentado e a expansão das áreas urbanas, artigo 4º/ a) da Lei de Bases do Ambiente, o que vêm ao encontro da política dos PEOT, pois estes são instrumentos regulamentares e de orientação, da responsabilidade da Administração Central, que visam criar uma política integrada de ordenamento do território como forma de zelar pelo desenvolvimento económico sem descurar o respeito pelo desenvolvimento ambiental sádio e sustentável.
Para concluir, os planos de ordenamento do território prosseguem a política pública de ambiente de forma a que se articulem o desenvolvimento económico e a preservação do meio ambiente.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Ambiente e Responsabilidade Civil

Ao Direito Civil reconhece-se usualmente um papel secundário na protecção do meio ambiente. A pretensão de uma abstenção ou de uma compensação pelo dano sofrido depende da iniciativa do Particular afectado, insuficiente para a prevista tutela constitucional do ambiente ( artigos. 52.º, n.º3, e 66.º da Constituição da República Portuguesa).


É de notar que o legislador integrou no principio da prevenção a obrigação do Poluidor “ corrigir ou recuperar o ambiente, suportando os encargos dai resultantes” e sendo-lhe vedado, continuar a acção poluente ( art. 3.º, al.a), da lei de Bases do Ambiente). Na seu formulação tradicional o principio da prevenção não abrange este tipo de obrigações. No rigor dos conceitos elas respeitam à responsabilidade do agente poluidor pelos danos a que der causa e não tanto ao princípio da acção preventiva.

Acolhe, também, à prevenção, associada à precaução, o principio do poluidor pagador, consagrado no artigo 174.º, do Tratado da Comunidade Euro peia , porquanto inclui a distribuição dos encargos financeiros com a defesa do ambiente. Alguns autores identificam esta regra, na sua vertente reparadora ou correctiva, com a Responsabilidade Civil. Contudo, enquanto o sistema da Responsabilidade Civil ambiental é limitado pela imputação a um agente concreto do comportamento que causou danos a um conjunto determinado de indivíduos lesados ou que frustrou a utilidade ambiental, o principio do poluidor-pagador serve para justificar a constituição de fundos ou institutos autónomos que, com independência do juízo de responsabilidade, suportam os custos emergentes da acção pública de reposição da qualidade do ambiente ou do apoio económico ás vitimas.

Uma primeira dificuldade surge na determinação do que sejam danos ambientais e na definição de ambiente.

Num conceito extensivo de ambiente, conforme indica o Professor Gomes Canotilho, enquadram-se todos os elementos naturais, culturais, económicos ou sociais que
influenciam de forma relevante o ser humano.

Segundo um conceito restrito, o ambiente limitar-se-ia ao chamado ambiente natural constituído pelos elementos fundamentais e naturais da vida humana, designadamente o solo, ar, água, biosfera, nas suas relações recíprocas e nas suas relações com os homens e outros seres vivos.

A Lei de Bases do Ambiente parece ter adoptado, no seu artigo. 5.º, n.º2, al.a), o conceito extensivo :” Ambiente é o conjunto dos sistemas físicos, químicos, biológicos e suas relações e dos factores económicos, sociais e culturais com efeito directo ou indirecto, mediato ou imediato, sobre os seres vivos e a qualidade de vida do homem”.

Para não se converter num conceito sem qualquer utilização, a noção de ambiente deve reconduzir-se, essencialmente, aos componentes ambientais naturais de que fala a lei de bases do ambiente ( artigos. 6.º a 16.º).

Ao contrário de outros sistemas jurídicos, o ordenamento constitucional e legal Português conformou o direito do ambiente sadio e ecologicamente equilibrado como um direito fundamental do cidadão, um direito subjectivo distinto dos outros direitos com protecção constitucional, como a saúde ou a propriedade. Um direito “ com cidadania própria” e instrumento de protecção contra agressões ilegais na esfera individual.

A defesa do direito ao ambiente não exige, contudo, a titularidade do direito de propriedade ou de outro direito real de gozo. O direito a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado é essencial ao livre e pleno desenvolvimento da personalidade.

O direito do ambiente, enquanto direito de personalidade que beneficia da tutela resultante do artigo 70.º , n,º2, do Código Civil ( “independentemente da Responsabilidade Civil a que haja lugar, a pessoa ameaçada ou ofendida pode requerer as providências adequadas às circunstâncias do caso, com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já cometida”) não se confunde com o direito à saúde. A essencialidade da manutenção do equilíbrio ecológico como elemento de equilíbrio vital do homem transcende as situações de perigo para a saúde do individuo.



O que se pretende com o instituto da responsabilidade civil por dano ecológico é ressarcir a geração presente pela degradação de um estado de um determinado componente ambiental e proporcionar à geração futura idêntico grau de fruição, respondendo, sempre que possível, o estado anterior à ocorrência do facto lesivo.
A noção de dano ecológico - o dano causado à integridade de um bem ambiental natural – não se impôs imediatamente após a descoberta do direito do ambiente. Esse reconhecimento surgiu com a directiva 2004/35 CE, do Parlamento e do conselho, de 21 de Abril, que veio estabelecer um quadro normativo de regulação, da prevenção e reparação do dano ecológico. De referir, que esta directiva foi transposta para a ordem jurídica Portuguesa pelo Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29 de Julho.

1-O quadro Normativo anterior ao decreto-lei n.º147/2008, de 28 de Julho:

Importa referir, que o nosso ordenamento jurídico não autonomizou, até à entrada em vigor do referido decreto-lei, o dano ecológico do dano ambiental (conforme é assumido pelo legislador no preâmbulo do referido diploma). Esta falta de distinção advém de, por um lado, a constituição não distinguir claramente as duas realidades no artigo 52.º/3, a lei de bases do ambiente (lei 11/87, de 7 de Abril), revela uma perspectiva individualista ou grupal do dano ambiental, por outro lado, a lei de acção popular ( Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto) ignora a diferença radical entre interesses individuais homogéneos e interesses de fruição de bens colectivos, reduzindo o regime de indemnização aos primeiros (artigo 22.º/2).
Esta não autonomização de dano ecológico, fazia com que este só pudesse ser invocado caso resultasse de uma acção lesiva de interesses individuais, cujo titular movesse uma acção inibitória contra o lesante, a qual pusesse fim à produção da emissão prejudicial para pessoas e bens naturais. O dano a ressarcir seria sempre o individual, não o colectivo.

Com a entrada em vigor do Decreto-Lei 147/2008, afirma-se a diferença entre dano pessoal/ patrimonial e dano ecológico, clarifica-se a legitimidade para reclamar a sua reparação; fixa-se os critérios de avaliação do dano e indica-se as formas da sua reparação.

2- O regime da Responsabilidade por dano ecológico estabelecido pelo decreto-lei 147/2008, de 29 de Julho:

Conforme já foi referido, este decreto-lei, tem na sua base o regime estabelecido pela directiva 2004/35/CE, do Parlamento e do Conselho Europeu, de 21 de Abril. Esta directiva visava vários objectivos, entre eles:

-Autonomiza o dano ecológico, sendo só aplicável a este, o mesmo é dizer, que, a reparação dos danos infligidos à pessoa ou à propriedade rege-se pelos princípios gerais da Responsabilidade Civil;

-Responsabiliza directamente os operadores ( das actividades listadas, no seu, anexo III, quanto à responsabilidade objectiva; todos, quando à responsabilidade subjectiva por lesão de espécies e habitats protegidos), públicos e privados, no âmbito da actividade lucrativa e não lucrativa, pelos custos de prevenção e reparação de danos Ecológicos comprovadamente causados pela sua actividade.

-Circunscreve os danos ecológicos aos danos causados às espécies e habitats protegidos no contexto da Rede Natura 2000, à água e ao solo, deixando aos estados a possibilidade de alargar o âmbito do dano ecológico a outros componente ambientais ( mais concretamente o subsolo e o ar)

-Tem por base o principio do poluidor pagador ( artigo 147/2 do Tratado de Roma), e adere a um conceito amplo de responsabilidade, que prescinde da ocorrência do dano. Permite a possibilidade de imposição de medidas de reparação e de prevenção, perante a ameaça de dano iminente a um dado bem natural, o que se funda no principio da prevenção.

-O dano ecológico tem de ser significativo, concreto e quantificável e imputável através do estabelecimento de um nexo de causalidade facto/dano.
Da directiva podemos retirar uma preferência pela reconstituição natural ou, caos esta não seja possível, a alocação de quantias pecuniárias exclusivamente à efectivação de medidas de reparação, complementares ou compensatórias. Por outro lado, a directiva parece não prever a hipótese de “dano moral” da colectividade pela perda de qualidade dos bens ambientais naturais.

Importa agora analisar a influencia da directiva no decreto-lei 147/2008, que estabeleceu o regime da responsabilidade por dano ecológico. Este diploma é aplicável em sede de prevenção e reparação de dano ecológico e só deste, na definição do seu artigo 11.º/1, d), dano ecológico é toda “ a alteração adversa mensurável de um recurso natural ou a deterioração mensurável do serviço de um recurso natural que ocorram directa ou indirectamente”.

De referir que há um alargamento do conjunto de bens naturais a coberto deste regime do DL 147/2008. Assim, para efeitos do referido diploma, são danos ecológicos (artigo 11º), todos os danos causados: à água; ao solo; e às espécies e habitats protegidos pelo ordenamento nacional, alargando o regime que tinha sido estabelecido pela directiva ( que só protegia as espécies e habitats protegidos ao abrigo da rede natura 2000), já que, o DL remete a identificação para “legislação aplicável” ( Decreto-Lei 142/2008- regime de conservação da natureza e da biodiversidade).

Também no âmbito subjectivo, o decreto-lei 147/2008 procedeu a um alargamento da directiva. Numa primeira análise, o decreto-lei segue o regime da directiva, no tocante à responsabilidade subjectiva (artigo 13.º do DL), seguindo o alargamento que a mesma preconiza, desafectando os lesantes da estrita enumeração das actividades do anexo III. Contudo, acrescenta-lhe um novo segmento, que respeita os bens sobres os quais os danos podem incidir. Enquanto a directiva impõe a responsabilização assente na culpa, de todos os sujeitos, por danos infligidos a espécies e habitats protegidos ao abrigo do regime da rede natura 2000, o decreto-lei acrescenta a responsabilização daqueles por quaisquer danos ecológicos, desde que compreendidos na categoria enumerada no artigo 11.º/1, alínea e), ou seja, também ao solo e à água.

Importa, agora, discutir uma questão, que se prende com o âmbito objecto de aplicação do diploma e que se prende com o universo de bens naturais abrangidos pelo regime da prevenção e reparação de danos económicos. Mais concretamente, a não consideração dos danos ao ar (e ao subsolo) como danos ecológicos. A directiva não os menciona, mas o decreto-lei, não pode, arbitrariamente, estabelecer distinções entre bens ambientais merecedores de tutela, preventiva, reconstitutiva e compensatória e bens isentos dela. Não há bens ambientais de 1ª e de 2ª. De referir que a LBA recenseia como bens ambientais naturais, no artigo. 6º: o ar, a luz, a água, o solo vivo e o subsolo, a flora e a fauna. Acresce que o artigo 66.º/2, a) da Constituição, impõe, como tarefa do Estado e demais entidades publicas, “ a prevenção da poluição”, não fazendo distinção entre recursos afectados por esta. Para alem do que, os danos ecológicos a ressarcir nos termos do artigo 52.º/3, a) da CRP, são relativos ao “ambiente” sem exclusão de qualquer componente.

Dai que só se possa concluir: que o regime estabelecido pelo Decreto-Lei padece de ilegalidade reforçada ( artigos 280.º/2, a) e 281.º/1, b) da CRP), por violar a LBA ( bem como de inconstitucionalidade indirecta por redução do âmbito de protecção de normas constitucionais de tutela do ambiente), na parte em que omite a referência aos componentes ar e subsolo, ou em nome de uma interpretação útil, se procede a uma leitura do regime estabelecido pelo decreto-lei conforme à LBA e à CRP, considerando dano ecológico também a degradação significativa das condições ecológicas do ar e do subsolo, sujeitando estas lesões ao regime da prevenção e reparação instituído pelo referido diploma.

O principio da prevenção está na base da consagração, pelo referido diploma, de uma compreensão alargada de responsabilidade, ou seja, independentemente da verificação do dano. Este regime visa salvaguardar a fragilidade de muitos bens naturais ( principalmente quando não regeneráveis), as quais, ofensas à sua integridade podem revelar-se irreversíveis. Está aqui em causa, essencialmente, o estabelecimento de deveres de defesa aos operadores de actividades que possam ter efeitos significativos sobre esses bens. Porque o ambiente é um bem público e frágil, as actividades que o possam afectar mais significativamente estão sujeitas a um principio de Proibição sob reserva de permissão, que só se ultrapassa através da concessão de autorizações necessárias à concretização de tais deveres . Assim, é estabelecido no decreto-lei 147/2008, um dever de adopção de medidas preventivas, tendo em vista a protecção do ambiente, sempre que: haja uma ameaça iminente de um dano ecológico, ou de novos danos subsequentes a uma lesão já ocorrida. Para o dano ser iminente, é necessário que esteja reunido um conjunto de pressupostos, que no plano da verosimilhança e probabilidade, permita, prever, com grau de certeza razoável, a eclosão daquele ( artigos 11.º/1, b) e 5.º e 14.º do D.L 147/2008).

3-Legitimidade alargada para requerer a prevenção/reparação de danos ecológicos:

Tanto a Directiva como o Decreto-lei alargam a legitimidade procedimental e processual a qualquer cidadão para defesa de um bem de fruição colectiva ( artigo 52.º/3, a) da CRP). Os referidos diplomas, aproveitam-se da “paralisação” entre dano ambiental/pessoal e dano ecológico para convidar o cidadão a tomar a ofensa à sua esfera jurídica como pretexto de defesa, também, dos componentes naturais, muito embora, se tenha presente que o objecto do referido decreto-lei é o dano ao ambiente, dai que o objecto directo da denuncia e do pedido de intervenção seja a salvaguarda deste bem jurídico.

No artigo 18.º do decreto lei, reconhece-se legitimidade para a denuncia da ameaça iminente de dano ecológico ou de verificação deste, em três situações:

a)- Caracterização de um dano patrimonial directo, actual ou provável (alínea c);

b)- Caracterização de um dano pessoal ou patrimonial colateral, actual ou provável (alínea a );

c)- caracterização de um dano exclusivamente ecológico, denunciável por qualquer actor popular, nos termos dos artigos 2.º/1 da lei 83/95, de 31 de Agosto, e 53.º/2 do CPA, a cujo o elenco se deve juntar o Ministério Publico ( artigo 9.º/2, do CPTA e artigo 26.º-A do CPC), ou seja Cidadãos, autarquias, fundações e associações que tenham a defesa do ambiente como objecto estatutário ( artigo 3.º da lei n.º83/95).

A natureza Pública do dano ecológico determina, que a acção seja proposta nos tribunais administrativos independentemente da natureza jurídica do operador ( artigo 4.º/1, l) do ETAF). Já não será assim, caso a acção diga respeito a um dano pessoal ou patrimonial do autor da acção, neste caso os tribunais competentes para conhecerem a acção serão os tribunais cíveis, sempre que a actuação lesiva não revestir natureza pública.

Conforme já foi analisa, a directiva autorizava os Estados-Membros a dispensar o operador de custear as operações de reparação de danos ecológicos advenientes de actividades por si desenvolvidas em determinados caos, nomadamente quando inexistir culpa daquele. O decreto-lei 147/2008, na senda da directiva, estabeleceu no seu artigo 20.º que o operador estaria libertado da obrigação de pagamento de medidas de prevenção/reparação num conjunto de situações, mais concretamente nos caos de responsabilidade objectiva ( mas já não exclui a obrigação do operador, enquanto entidade mais próxima do evento lesivo adoptar essas medidas de prevenção e reparação, no mais curto prazo). Assim o artigo 20.º estabelece essa dispensa nos seguintes casos:

a)-Responsabilidade por facto de outrem ou instrução administrativa;

b)- Responsabilidade objectiva.

No primeiro caso, o legislador exige que o operador avance com o montante correspondente ás medidas preventivas ou reparatórias, reconhecendo-lhe direito de regresso contra o terceiro que provocou a lesão ou o dano, bem como contra a entidade administrativa que emitiu a ordem ou instrução que concorreu para a formação da ameaça ou para a produção do dano. ( artigo 20.º/1 e 2 do D.L 147/2008).
No segundo caso, o legislador exime o pagamento de custos de prevenção e reparação dos danos ecológicos o operador que, actuando sem culpa, provoque uma lesão ambiental:

1-No âmbito de actividades listadas no Anexo III;

2-No âmbito de qualquer outra actividade não tipicamente conotada como actividade de risco, com base no estado de conhecimento técnico-científico à data da eclosão dos factos.

O artigo 20.º/3 do D.L deve ser lido conjuntamente, quer com os artigos 7 e 12 do referido diploma, quer como o artigo 41 da Lei de Bases do Ambiente, desta leitura conjugada dos artigos retira-se: por um lado, admite-se a responsabilização objectiva por danos significativos causados ao bens ecológicos advenientes de “ acções especialmente perigosas”, por outro lado, este modelo de imputação só incidirá sobre certas actividades, conotadas como tipicamente aptas a produzir danos significativos nos componentes ambientais naturais.

O instituto da Responsabilidade Objectiva, porque prescinde da culpa, deve estar
reservado, no contexto da sociedade de risco, a um conjunto circunscrito de actividades potencialmente perigosas, cujos operadores ficam plenamente cientes de que, aos custos de produção, caberá juntar custos de suportação de danos à colectividade. Assim deve ler-se o artigo 20.º/3 do decreto-lei como:

-No caso da actividade inscrita no anexo III, o operador ficará isento da responsabilidade por danos e riscos associados ao funcionamento normal da instalação. Para a Professora Carla Amado Gomes, trata-se de uma má solução, que faz impender sobre o Estado toda e qualquer negatividade que possa resultar de uma actividade tipicamente perigosa mas autorizada à luz dos melhores conhecimentos e técnicas disponíveis, obnubilando o benefício económico que o operado dela retira. Tal risco, deveria ser suportado pelo operador e não pela comunidade.

O Estado executa as medidas necessárias e suporta estes custos, financiando-se a partir do fundo de intervenção ambiental (artigos 17.º/1, b), 19.º/5 e 23.º do D.L 147/2008).

Por outro lado, o operador será responsável pelos danos/riscos decorrentes do funcionamento anormal daquela actividade. É um risco compreendido na álea da iniciativa económica assumida pelo operador, que detendo os lucros deve suportar os custos causados pelos desvios ao percurso normal da actividade.

A problemática existe quando o operador se veja obrigado pela totalidade dos custos, uma vez que o legislado não fixou tectos indemnizatórios. O Artigo 41.º/2 da LBA parece apontar para esta situação, bastante comum no plano da responsabilidade Objectiva ( artigo 508.º do Código Civil) .

Constituindo a prevenção e a reparação de danos ecológicos uma tarefa fundamental das entidades públicas (artigo 9.º, e) e 66.º/2 da CRP), certo é que esta obrigação se reparte com os operadores económicos e demais sujeitos, uma vez que sobre estes impende identicamente um dever de protecção do ambiente ( artigo 66.º/1 da CRP). O Decreto-lei 147/2008 impões aos operadores, económicos e outros, no caso de imputação subjectiva, a obrigação de executar e custear as medidas preventivas e reparatórias motivadas pela necessidade de fazer face aos danos e ameaças de danos ecológicos resultantes da sua actividade ( artigos: 13.º/1, 14.º/1 w 15.º/1, b) e c) do Decreto-Lei 147/2008). Nas hipóteses de danos provocados por operadores não identificados, situações de extrema urgência de actuação e sempre que o operador não cumprir as obrigações de reparação necessárias, ficam entregues, em ultimo recurso, à iniciativa de entidade publica competente.

4-Algumas criticas ao diploma:

Muitas vezes, num domínio como o Direito do Ambiente, a imputação dos danos torna-se particularmente difícil, em virtude da inexistência de informação suficiente sobre as causas do dano e de fenómenos de causalidade alternativa. No referido regime da Responsabilidade Civil por danos ecológico, está referido um critério de aferição da causalidade( artigo 5.º do D.L 147/2008) e estabeleceu uma presunção de repartição da Responsabilidade em partes iguais no caso de cumulação de acções lesivas (artigo 4.º/2). Contudo não se reporta à inversão do ónus da prova a favor do denunciante ( decorrência natural do principio da prevenção), nem toma posição no que toca aos casos de causalidade alternativa ( aqueles em que vários sujeitos podem ter concorrido para o dano, não sendo possível estabelecer uma causalidade inquestionável). No caso Português poderia ter-se seguido o exemplo Alemão, estabelecendo uma presunção de causalidade para os casos de responsabilidade alternativa. Quando à regra de inversão do ónus da prova, a mesma, pode considerar-se uma decorrência lógica do principio da prevenção, logo a sua afirmação expressa não constituiria surpresa.

4-Conclusão:

Em suma, da análise deste diploma que estabelece a responsabilidade civil por danos ecológicos ( Decreto-Lei 147/2008 de 29 de Julho) podemos retirar aspectos positivos e aspectos negativos. Por um lado, o diploma dá um passo no sentido da autonomização do dano ecológico e fixa critério para a reparação e compensação do dano ecológico mas esquece o estabelecimento da regra da inversão do ónus da prova. Acresce a má solução quanto à exoneração do operador de responsabilidade objectiva pelos riscos ligados ao normal funcionamento da instalação e também a exclusão de bens ambientais como o ar, o subsolo e o solo do universo de componentes sujeitos a danos ecológicos. Logo, podemos afirmar que criação do referido diploma constituiu um importante desenvolvimento no que à tutela do ambiente diz respeito. Permitiu quer à administração, quer aos particulares ter acesso a mecanismos mais eficientes para reagir a eventuais lesões atentatórias do ambiente. Contudo, importa igualmente reconhecer, que o referido diploma padece de inúmeros aspectos negativos a merecerem a atenção do legislador.

Bibliografia:

PEREIRA DA SILVA, Vasco, “Verde cor de Direito – Lições de Direito do Ambiente”, 2ª Reimpressão da Edição de Fevereiro 2002

SOUSA ANTUNES, Henrique, “Ambiente e Responsabilidade Civil¬– Estudos dedicados ao Prof. Doutor Mário Júlio Brito de Almeida e Costa”, Lisboa, 2002, págs. 643 e segs

AMADO GOMES, Carla, “A responsabilidade civil por dano ecológico ¬– Reflexões preliminares sobre o novo regime instituído pelo Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29 de Julho”, Jornadas de Direito do Ambiente