sábado, 23 de maio de 2009

Direito Sancionatório Ambiental

O direito ao meio ambiente está consagrado constitucionalmente no nosso pais no art.66º, CRP. A natureza deste direito é doutrinariamente discutida, sendo que actualmente existem muitos autores que o encaram como um verdadeiro direito fundamental que goza do regime garantístico destes direitos.
Deste modo, a partir do momento em que é encarado como direito fundamental deve ser estabelecido legalmente um regime de protecção adequado, pelo que poderá ser criado um particular direito sancionatório ambiental. Mas será este um meio vantajoso de protecção e de garantia do cumprimento das disposições ambientais? E qual seria a forma mais eficaz de configurar este direito? Em abstracto, podemos ter dois modos de protecção: através do direito penal ambiental; ou através do direito contra-ordenacional ambiental. A solução mais adequada variará de país para país, pois ambos os métodos têm vantagens e padecem de inconvenientes. Porém, hoje a maioria dos países combinam os dois, na procura sempre de um modo mais eficaz de protecção.
Vamos analisar então as duas formas sancionatórias.

● Direito Penal
Ao servirmo-nos do Direito Penal para preservar o ambiente estamos a conferir-lhe antes de mais uma maior carga simbólica, pois poderá ser entendido como uma maior preocupação do Estado com a tutela do ambiente. Contudo, alguns autores assentam neste simbolismo a sua primeira crítica: que não passaria disso mesmo, um simbolismo sem efectividade. Por outro lado, é defendido que este direito oferece uma tutela mais rigorosa, na medida em que a violação das normas ambientais é entendida como um crime, o que acaba por conduzir a uma maior eficácia da protecção. Contrariamente ao que sucede com as contra-ordenações, o processo penal concede também mais garantias ao particular, garantias consagradas constitucionalmente.
Todavia, o Direito Penal comporta também algumas desvantagens.
Por um lado, não encontramos aqui a vertente preventiva que é tão necessária nos crimes ambientais, pois este ramo do direito não é adequado à área que estamos aqui a estudar. Porém, apesar de poder não se encontrar muito desenvolvida, encontramos sempre esta vertente preventiva no Direito Penal. Também é dito que este direito é feito a pensar nos indivíduos concretos, e que no âmbito ambiental é mais acentuada a actuação das pessoas colectivas. Mas mais uma vez, já vem sendo admitida a criminalização das pessoas jurídicas. É ainda dito que esta tutela penal dependeria de um incumprimento administrativo, do qual seria subordinado, mas esta subordinação não põe em causa o direito penal. Não podemos porém negar que verificamos nesta área uma falta de eficácia do Direito Penal, dado que são raros os casos de punição na violação de disposições ambientais. Contudo, isto será já uma questão sociológica, e não poderemos abandonar um bom método só porque existam falhas na sua aplicação.

●Direito Contra-Ordenacional
Este Direito é efectivamente mais célere quando comparado com o Direito Penal, e também encontramos a responsabilização dos indivíduos e das pessoas colectivas. Por outro lado, ao utilizarmos o direito contra-ordenacional estaremos a preservar a autonomia do Direito Penal, pois as realidades ambientais não deixam de ser de difícil conciliação com este último ramo do direito.
Todavia, a contra-ordenação implica uma diminuição das garantias dos particulares no processo. Também a configuração da violação enquanto contra-ordenação conduz à ideia de banalização das acções contra o ambiente, o que não é compatibilizado com a vertente da prevenção que esta realidade necessita. Problema mais preocupante será o facto de que o pagamento de multa que advêm deste processo passa a ser encarado como um mero custo de produção, uma vez que o incumprimento poderá até compensar.

Comparando os benefícios e desvantagens dos dois processos chegamos à conclusão que deverá ser seguida uma conciliação entre os dois, de modo a eliminar as desvantagens existentes.
Em Portugal está em vigor a Lei 50/2006, de 29 de Agosto, o regime das contra-ordenações ambientais. É assim garantido uma tutela penal para os crimes ambientais mais graves. Porém, se o Direito Penal não se mostra eficaz, e a multa conduziria à banalização de condutas, não deveria haver outra forma de condicionar a actividade económica que viole as normas ambientais? Como defende o Prof. Vasco Pereira da Silva, poderíamos ponderar a suspensão da actividade da empresa infractora, ou uma limitação da comercialização, e que estas deveriam ser as sanções-regra na área ambiental.

Analisando o regime interno, poderemos encontrar normas penais e normas contra-ordenacionais.

● Direito Penal
No nosso Código Penal encontramos no capítulo III dos crimes contra a vida em sociedade, os crimes ambientais, presentes nos artgs. 272º e seguintes. São vários os crimes aqui existentes: os danos contra a natureza, a poluição, a poluição com perigo comum, e o incêndio florestal, O Acórdão 213/95 do Tribunal Constitucional vem-nos dizer que entre o Direito Administrativo e o Direito Penal não existe uma relação de subordinação, mas antes uma lógica de complementaridade, e não haverão normas penais em branco. Certo é que é nítido o privilégio da prisão e da multa consagrado pelo nosso ordenamento jurídico no que toca aos crimes ambientais, em prejuízo de outras medidas talvez mais eficientes (por exemplo, a suspensão da actividade económica).

●Direito Contra-Ordenacional
A Lei 50/2006, a Lei-Quadro das Contra-Ordenações, dá-nos uma visão um tanto limitada do Direito Contra-Ordenacional Ambiental, como diz o Prof. Vasco Pereira da Silva, pelo que deveria antes ter existido uma compilação da legislação já elaborada, e a partir daí ser feito um regime geral. Esta lei consagra a responsabilidade das pessoas colectivas e titulares dos cargos (8º/2), e estão previstas medidas cautelares e sanções adequadas ao direito ambiental (41º, 42º, 48º)., bem como sanções acessórias (30º). Respeitando uma lógica de prevenção, o art 65º consagra um registo dos infractores e estão previstos prazos mais curtos neste processo.
Porém, este regime vigente apresenta alguns inconvenientes.
Por um lado, existe uma repetição do regime geral em algumas disposições, resultado da ausência de codificação já assinalada. Esta ausência vai gerar um âmbito de aplicação limitado, pois as leis anteriores não consideram esta nova lei. Existe também uma excessiva abertura em algumas normas, mas poderiam ainda ter-se ido mais longe na responsabilização das pessoas colectivas, uma vez que são os principais intervenientes na área ambiental. Por último, o art.21º consagra uma classificação das infracções em leves, graves e muito graves, a qual vai influenciar o montante da multa estipulado, mas não está adaptado a infracções cometidas antes da entrada em vigor desta lei. Para o Prof. Vasco Pereira da Silva só poderiamos evitar neste caso a violação do princípio da tipicidade se existisse uma codificação das normas já existentes, ou se entendermos que esta classificação só valeria para o futuro.

Em suma, em ambos os métodos encontramos vantagens e desvantagens, mas isso não deve impedir o legislador de procurar uma protecção cada vez mais eficaz do meio ambiente. Até porque vão sempre surgindo novas formas de perigo para o Ambiente que exigem uma resposta adequada e dissuasora de comportamentos.