domingo, 24 de maio de 2009

Princípio da Prevenção VS Princípio da Precaução

Nem sempre a Natureza e a sua protecção foram levadas a sério.
Apesar da preocupação que cada um pudesse demonstrar acerca da sua preservação, a nível societário só recentemente se começou a vislumbrar a tomada de consciência de que a preservação do ambiente é uma tarefa que a todos concerne e em que todos são responsáveis.
Assistimos ao aflorar de inúmeras medidas, tanto sociais como políticas, que demonstram que nasceu uma nova consciência ambiental, que é necessário fomentar cada vez mais e de uma forma mais intensa.
Assim, e entre nós, podemos começar por enunciar as medidas tomadas a nível constitucional. Na nossa CRP, estão plasmados alguns princípios atinentes ao ambiente e à sua protecção e conservação. Um deles é o cerne da questão aqui levantada: o princípio da prevenção.
Este princípio aparece-nos de uma forma um pouco abstracta, no art. 66º/2 CRP. Porém, o seu objectivo principal é evitar a produção de danos ao meio ambiente, nomeadamente com um conjunto de medidas preventivas, destinadas a identificar situações potencialmente poluidoras, para, no momento seguinte, proceder ao seu afastamento ou redução dos seus efeitos nocivos.
Analisado deste modo, o princípio da prevenção tem de ser visto sob dois prismas: o restrito, quando este princípio actua de modo a evitar perigos imediatos e concretos; e o amplo, quando age de modo a evitar danos ou riscos futuros.
Todavia, este princípio tem vindo a ser afastado de um outro princípio pela doutrina: o princípio da precaução. Diz esta corrente que não deve o princípio da prevenção ser visto sob a égide de uma concepção ampla e restrita, pois que a verdadeira acepção de prevenção é evitar os perigos imediatos e concretos, enquanto que o afastamento de situações potencialmente perigosas pertence ao domínio do princípio da precaução.
Mas vejamos os argumentos das duas partes da questão. De um lado, temos os Autores que defendem a precaução como princípio autónomo. Para estes, a precaução actua num momento prévio à actuação do princípio da prevenção, ou seja, enquanto que o princípio da prevenção actua quando existe a certeza de um risco a eliminar, o princípio da precaução actua quando exista um perigo abstracto para o ambiente, mesmo que ainda não esteja estabelecido nenhum nexo de causalidade entre a actividade potencialmente geradora de poluição e o dano causado.
Essa forma de actuar, faz com que sejam inúmeras as dificuldades de concretizar tal princípio. Essa dificuldade é reconhecida, entre nós, por Autores como Ana Gouveia Martins e o Prof. Dr. Gomes Canotilho. Dizem estes Autores que o princípio da prevenção tem como limite o risco. Risco esse que existe sempre que não haja uma certeza indubitável (científica) de que certo acto vai gerar um dano a determinado bem jurídico.
Então, a precaução entraria em campo para actuar sobre riscos previsíveis provocados por acções humanas. Assim dito, o que se pretende alcançar com o princípio da precaução é a tomada de medidas para evitar possíveis danos ambientais, mesmo quando não haja certeza científica no nexo causal entre a actividade e o dano.
Do lado oposto, temos os Autores que defendem a incomportabilidade de uma separação entre o princípio da prevenção e o da precaução. Como nome mais sonante, podemos invocar o Prof. Dr. Vasco Pereira da Silva, que defende o princípio da prevenção sem a separação das duas vertentes, ou seja, uma concepção ampla.
Senão, vejamos: o princípio da prevenção segue a velha máxima “mais vale prevenir do que remediar”. Em termos práticos significa isto que a melhor política a adoptar para evitar danos ambientais graves e, muitas vezes, irreversíveis (como por exemplo, a extinção de certa espécie animal ou vegetal) é a preventiva.
Rege-se este princípio pelo raciocínio de que uma actuação a nível preventivo além de sortir melhores efeitos, também é menos onerosa do que a actuação após os danos terem ocorrido.
Ou seja, é mais comportável actuar antes do dano acontecer, de forma a que este nunca se verifique, do que tentar minimizar os seus efeitos depois deste já ter ocorrido.
Quanto a este “novo” princípio da precaução, diz o Autor que se pauta pela incerteza, pela mera eventualidade do dano acontecer. Em termos práticos este princípio tem difícil (quiçá impossível) aplicação. Daí a dificuldade que os Autores que defendem a sua autonomização sentem a fazer a delimitação dos seus critérios.
Alega também o Prof. que com a autonomização dos princípios assistiríamos a uma desprotecção legal dos dois, uma vez que o princípio da prevenção, ao ter consagração constitucional, goza de toda a protecção que a CRP implica.
Posto isto e tendo em conta todos os argumentos aqui analisados, cremos que é de adoptar a posição do Prof. Dr. Vasco Pereira da Silva e não proceder à separação dos dois princípios.
Essa autonomização conduziria à máxima «in dubio pro natura» que conduzida ao extremo, tornaria insustentável a prática de qualquer actividade atinente ao desenvolvimento das sociedades, o que, também, não seria um fenómeno benéfico em termos de desenvolvimento sustentável.
O que se pretende com as medidas de protecção do ambiente não é que haja um «risco zero» para o mesmo (até porque tal seria impossível), mas sim um equilíbrio entre a actividade humana (potencialmente geradora de danos ambientais) e o meio ambiente.