quarta-feira, 27 de maio de 2009

Novo regime de Responsabilidade Ambiental

Novo regime da Responsabilidade Ambiental

Entrou em vigor no dia 1 de Agosto de 2008 o Decreto-lei n.º 147/2008, de 29 de Julho que estabelece o regime jurídico da responsabilidade por danos ambientais. Este novo regime não se aplica aos danos causados por quaisquer emissões, acontecimentos ou incidentes, anteriores a esta data, nem aos danos causados por quaisquer emissões, acontecimentos ou incidentes que ocorrem após a entrada em vigor do diploma mas que decorram de uma actividade específica realizadas e concluída antes da referida data.
Este decreto-lei transpõe a Directiva n.º 2034/35/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Abril de 2004 com alterações introduzidas pela Directiva n.º 2006/21/CE, do Parlamento e do Conselho, desenvolvendo a Lei de Bases do Ambiente e reflecte o princípio do “poluidor-pagador”.
Este regime e o princípio de responsabilização (artigo 3.º h) da Lei de Bases do Ambiente) é fundamental ao lado do princípio da prevenção, pois ao atribuir direitos aos particulares, constitui um mecanismo económica e ambientalmente eficiente pois os particulares, uma vez que dotados de direitos indemnizatórios, tornam-se “zeladores” do ambiente.
Salienta-se os seguintes pontos do regime:
- Âmbito de aplicação (artigo 2.º): aplica-se aos danos ambientais, bem como às ameaças iminentes desses danos causados no exercício de uma actividade económica, pública ou privada, lucrativa ou não. Exclui-se a responsabilidade administrativa pela prevenção e reparação de danos ambientais quando estes ou ameaças iminentes sejam causados por actos de conflito armado, hostilidades, guerra civil ou insurreição; em consequência de fenómenos naturais imprevisíveis ou inevitáveis; quando os actos se destinem à defesa nacional ou segurança internacional e quando o único objectivo das actividades seja a protecção contra catástrofes naturais. O referido decreto-lei não tem aplicação, também, quando a responsabilidade seja abrangida pelo âmbito de aplicação de alguma convenção ou instrumento internacional, enumerados nos anexos I e II, respectivamente.
- Responsabilidade solidária entre as Pessoas Colectivas e respectivos directores, gerentes ou administradores (artigo3.º) se a actividade lesiva for imputável à pessoa colectiva. A responsabilidade ambiental estende-se igualmente à sociedade-mãe ou dominante nos casos de grupos de empresas ou relações de domínio.
- Responsabilidade solidária entre comparticipantes (artigo 4.º) – se a responsabilidade recair sobre várias pessoas, todas respondem solidariamente, mesmo que haja culpa de alguma ou algumas, com possibilidade de exercício de direito de regresso na medida das respectivas culpas.
- Nexo de causalidade (artigo 5.º) assenta em critérios de verosimilhança e de probabilidade de o facto danoso ser apto a produzir a lesão verificada.
- Regime de Responsabilidade Civil subjectiva e objectiva (artigos 7.º a 10.º) – traduz a ideia que os operadores-poluidores indemnizam os indivíduos lesados. Quem ofender direitos ou interesses alheios através da lesão de um componente ambiental, no exercício de uma actividade económica enumerada no anexo III, nomeadamente aquelas que necessitam de licença ambiental, de gestão de resíduos, ou relativas a substancias perigosas, ou com descargas para a água, é obrigado a reparar os danos causados, independentemente da existência de culpa (artigo 7.º). Deste modo, sempre que haja qualquer lesão ambiental no exercício das referidas actividades económicas, o operador é responsável.
Em caso de culpa, há sempre responsabilização ainda que não seja no exercício das referidas actividades económicas (artigo 8.º).
A reparação pode ser reduzidas ou atenuada quando um facto culposo do lesado concorreu para a produção ou agravamento do resultado (artigo 9.º).
Caso os danos referidos sejam prevenidos ou reparados nos termos do capítulo III, os lesados não podem exigir qualquer reparação ou indemnização (artigo 10.º n.º1).
- É criado um regime de Responsabilidade Administrativa pela prevenção e reparação de danos ambientais. Este tipo de responsabilidade traduz-se na prevenção ou reparação dos danos causados ao ambiente perante toda a colectividade. Assim, o operador responsabilizado, subjectiva ou objectivamente, é obrigado a adoptar medidas de prevenção e reparação dos danos ou ameaças causados (artigo 12.º), sem prejuízo da responsabilidade a que haja lugar nos termos dos artigos 7.º e 8.º. Estas medidas devem ser tomadas imediatamente (artigo 15.º n.º1b), sendo fixadas pela autoridade competente, a Agencia Portuguesa para o Ambiente (artigo 16.º n.º2 e 29.º). Os custos são suportados pelo operador (artigo 19.º), excepto nas situações do artigo 20.º
- Impõe o cumprimento de obrigações de informação perante autoridades competentes quando exista um dano ambiental ou a sua verificação seja iminente.
- Obrigação de constituição de garantias financeiras que permite assumir a responsabilidade ambiental inerente à actividade desenvolvida. Os operadores que exerçam as actividades ocupacionais enumeradas no anexo III constituem obrigatoriamente uma ou mais garantias financeiras próprias e autónomas, alternativas ou complementares entre si, que lhes permitam assumir a responsabilidade ambiental inerente à actividade por si desenvolvida (artigo 22.º). A constituição destas garantias só será exigível a partir de 2010 e sobre as mesmas incidirá uma taxa de montante máximo de 1% destinada ao Fundo de Intervenção Ambiental (que suporta os custos de intervenção publica e de reparação de danos ambientais, criado pela Lei n.º 50/2006, de 20 de Agosto e regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 150/2008 de 30 de Julho.
- Prevê aplicação de coimas e sanções acessórias (artigo 26.º e 27.º), nomeadamente nos casos em que não se cumpre a obrigação de prestação de informações.

A ideia de responsabilidade por danos ambientais e o princípio do poluidor-pagador, já existia à luz do direito português embora sem a concretização, regulamentação e o pormenor que este regime traz.
Desde de logo como princípio específico do direito do ambiente na alínea a) “Da prevenção: as actuações com efeitos imediatos ou a prazo no ambiente devem ser consideradas de forma antecipativa, reduzindo ou eliminando as causas, prioritariamente à correcção dos efeitos dessas acções ou actividades susceptíveis de alterarem a qualidade do ambiente, sendo o poluidor obrigado a corrigir ou recuperar o ambiente, suportando os encargos daí resultantes, não lhe sendo permitido continuar a acção poluente” e alínea h) do artigo 3.º da Lei de Bases do Ambiente “Da responsabilização: aponta para a assunção pelos agentes das consequências, para terceiros, da sua acção, directa ou indirecta, sobre os recursos naturais”. Nesta disposição já se enquadraria não só as situações de danos efectivos mas também as situações de risco e as medidas preventivas funcionalmente dirigidas a evitar os danos.
O princípio da responsabilização por danos ao ambiente tem dignidade constitucional, no artigo 52.º que se concretizava nos artigos 22.º e 23.º da Lei da Acção Popular, e ainda no artigo 41.º e 48.º da Lei de Bases do Ambiente. Estas consagrações eram insuficientes e incompletas daí a necessidade deste novo regime. Com o novo regime clarificou-se a questão do nexo de causalidade (artigo 5.º), do concurso de imputações (artigo 10.º), delimitação do âmbito de aplicação das normas (artigo 2.º) e o cumprimento da obrigação de prestar informação.
Em relação ao princípio do poluidor-pagador, este princípio que nos diz que cabe ao poluidor suportar os custos económicos da poluição que produza, distingue-se do princípio da responsabilidade por danos ambientais por não se limitar à reparação de danos, mas estar mais vocacionado para a precaução, prevenção e redistribuição dos custos da poluição – é um princípio que actua antes dos danos terem ocorrido.
Concluindo, apesar de essencial, este regime de responsabilidade civil não pode ser instrumento exclusivo ao serviço da protecção do ambiente. Para muitos poluidores as indemnizações constituem apenas mais um custo de protecção e continuam a obter benefícios com as suas actividades. A protecção do ambiente deve, sempre que possível, ancorar-se em instrumentos de cariz preventivo, como por exemplo, a avaliação de impacto ambiental.