domingo, 24 de maio de 2009

O Imposto Ambiental

O imposto ambiental

Um Estado fiscal não se pode limitar a coordenar a economia através do estímulo e da intervenção ele tem de estar dotado de mecanismos e de instrumentos de transformação e modernização das estruturas sócio-económicas. Assim, o sistema tributário no seu conjunto representa um dos instrumentos de que o Estado dispõe para prosseguir as tarefas de que a Constituição o incumbe. Este instrumento mostra-se funcional e estruturalmente adequado à realização dos direitos sociais, entre os quais se destaca o direito a um ambiente saudável.
O imposto pode ser definido como uma prestação patrimonial unilateral a favor de um ente público sem qualquer carácter sancionatório e de acordo com uma norma legal impositiva. Desta forma, o imposto pode representar um mecanismo eficaz e eficiente de protecção ambiental exercendo funções preventiva, restauradora e promocional. Através deste mecanismo promovemos a igualdade entre os cidadãos, o aproveitamento racional dos recursos (artigo 66º, nº2, alínea d) e 81º, alínea c) da CRP), garantindo um “ambiente de vida humano sadio e ecologicamente equilibrado” (artigo 66º, nº1 da CRP).


Finalidades dos impostos ambientais

É possível identificar duas espécies de impostos ambientais. Por um lado, aqueles que visam uma finalidade redistributiva. Por outro lado, aqueles que prosseguem uma actividade extrafiscal.
Assim, aqueles que prosseguem uma actividade extrafiscal visando promover directamente uma alteração de comportamentos podem ser designados como impostos ambientais em sentido próprio. Aqueles que têm como primeiro objectivo a obtenção de receitas a aplicar em projectos de defesa ecológica serão impostos ambientais em sentido impróprio.
No entanto, qualquer das modalidades permite realizar uma internalização das externalidades tendo um efeito estimulante embora em grau diverso. Os extrafiscais além de mais frequentes permitem recolher fundos a aplicar na despesa pública de natureza ambiental, operando, simultaneamente, uma redistribuição dos custos associados à defesa do equilíbrio ecológico por todos os sujeitos. Os redistributivos, por seu lado, pretendem incitar o poluidor a tomar por si próprio, pelo menor custo, as medidas necessárias para reduzir a poluição, escolhendo vias alternativas de actuação, redistribuindo os custos da poluição.
Desta forma, os impostos ambientais em sentido próprio inserem-se numa linha de prevenção (do dano ambiental) e os em sentido impróprio visam a recuperação (do equilíbrio ecológico). Ambos constituem instrumentos fundamentais da política ambiental.


A Finalidade não sancionatória do imposto ambiental


Não parece correcto atribuir uma finalidade punitiva à figura que se define como eco imposto. A atribuição de um carácter sancionatório aos tributos ambientais pode colocar em causa a sua classificação como verdadeiros impostos. Desde logo, os tributos ambientais são em regra pensados para situações lícitas. Desta forma, podemos afirmar com certeza que a ratio que preside à sua criação não é a mesma que aquela em que se fundam as sanções. Mesmo nos casos, em que, o imposto conduza à supressão da actividade nociva, por ela não ser ilícita não é seu objectivo puni-la, mas incentivar os sujeitos a desenvolver soluções que possibilitem a diminuição da sua danosidade ou a sua substituição por respostas mais adequadas e desejáveis. Nesta medida, o objectivo é o de desacelerar o ritmo de crescimento daquela pratica incentivando a utilização de novas práticas mais eficazes, eficientes e socialmente proveitosas. O tributo confere, pois, ao sujeito um espaço de manobra que a sanção lhe nega.
O Estado com os tributos ecológicos, não está a fazer uso do seu poder de repressão ou da sua função de polícia, mas sim a actuar como defensor da qualidade de vida, exercendo o direito que lhe cabe sobre o património do cidadão obrigando-o a cumprir o seu dever de solidariedade.
Podemos pois afirmar, que se tratam de objectivos de direccionamento comportamental (incentivo) e de obtenção de receitas, ou seja, fins fiscais e extrafiscais que justificam os tributos em causa, e não objectivos sancionatórios.


A Capacidade Recaudatória do imposto ambiental


No que diz respeito à objecção de que os chamados eco-impostos não são verdadeiros impostos em virtude da actividade que lhes subjaz podemos ainda afirmar que estes instrumentos podem carregar uma “incapacidade recaudatória”. Esta expressão usada por Garcia Quintana vai no sentido de considerar, que estes instrumentos não são aptos a recolher um volume crescente ou constante e em montantes significativos de receita. No entanto, isto nem sempre se verifica, mas mesmo quando se verifica nem por isso essas figuras deixarão de ser impostos. Se por um lado se verifica que quanto mais eficaz for o tributo ecológico que visa incentivar a adopção de comportamentos menos danosos para a sociedade menor será a receita obtida através dele, esta nunca chegará a ser nula. E, isto porque a actividade tributada é socialmente útil e as possibilidades de substituição de comportamentos poluentes por outros são limitadas. Por outro lado, essa actividade tem sempre inerente um certo grau de deterioração ambiental (que pode naturalmente ser maior ou menor), por mais que a ciência avance na descoberta de técnicas e de tecnologias mais limpas e mais eficientes.
Desta forma, o progressivo incremento desta espécie de tributos faz sentido na medida em que a absoluta pureza ecológica das actividades económicas é impossível de alcançar mas também porque é necessário atingir níveis cada vez mais elevados de compatibilidade ambiental. Antecipa-se, por isso, que o valor atribuído pela sociedade à qualidade ecológica vá aumentando e acompanhando a evolução dos níveis de rendimento. Podemos pois, afirmar que estes gravames são sempre capazes de gerar receita, o que se não se verificasse vedaria a sua classificação como impostos.



O objecto do imposto ambiental


O imposto ecológico tem de ter por objecto uma actividade ou uma situação que além de manifestar capacidade contributiva, apresenta uma ligação estreita com o dano ambiental e com a internalização das externalidades pois só assim se verifica o requisito da necessidade. Deve portanto, existir uma conexão entre o facto gerador da obrigação fiscal e a base tributável.
Estes impostos podem incidir sobre índices directos de riqueza que sejam o resultado ou o meio de realização de uma actividade poluente, ou sobre índices mediatos de riqueza que se traduzam na utilização desta, quer mediante a transferência quer mediante o consumo de bens cuja produção, uso ou eliminação é susceptível de causar danos ambientais.
A mais eficaz tributação na prevenção do dano ecológico é, à partida, a tributação directa das emissões poluentes, só devendo ser preterida em favor da imposição de bens cujo uso no processo produtivo ou no consumo final desencadeie uma agressão ao ambiente quando se observe uma relação estável entre os referidos comportamentos e a ocorrência dos danos, a contabilização das emissões poluentes seja complexa, custosa ou impossível e a purificação destas seja inviável.
Há, assim, necessidade de atender a vários factores como sejam a complexidade do problema ambiental em causa, as opções tecnológicas disponíveis, o tipo de reacção que se deseja que os agentes económicos adoptem, a localização das fontes poluentes e a concentração das emissões para se optar entre uma base tributável que apresente uma conexão directa com a produção de emissões poluentes e uma outra em que essa ligação seja indirecta.
O imposto sobre as emissões poluentes pode assumir várias modalidades. Uma é a de se tributar as externalidades geradas acima de um determinado nível, o qual, em princípio, deverá ser fixado no ponto em que ocorre uma afectação óptima de recursos numa perspectiva paretiana. Outra consistirá na imposição de cada unidade de custos externos produzidos.
Estes instrumentos fornecem um incentivo à adopção de técnicas de eliminação e de estratégias de prevenção estimulando o uso de processos produtivos mais sustentáveis, provocando de modo directo um aumento do preço dos bens poluentes no mercado, favorecendo a posição competitiva dos seus substitutos mais “amigos do ambiente”.
A tributação das emissões é uma solução viável mas, apenas, quando se consiga identificar as fontes poluidoras e medir as emissões geradas sendo portanto afastada quando se trate de poluição difusa. Assim, vislumbra-se como adequada a tributação dos bens associados ao dano ambiental no caso de poluição difusa, em que a tarefa de medição e de controlo da agressão ambiental se mostra difícil ou impossível. Um imposto que incida sobre o próprio produto pode constituir uma forma de promover indirectamente a alteração dos comportamentos para moldes mais sustentáveis. Desta forma, um imposto sobre os factores produtivos pode desempenhar a mesma função que um tributo sobre as emissões poluentes, quando a causa destas é o consumo desses factores. A prevenção das emissões pode, mesmo, revelar-se mais eficaz e menos custosa se em vez de se central no momento final aquando da medição, tiver lugar em todos os níveis intermédios do processo produtivo.



Os sujeitos do imposto ambiental

O sujeito activo

Este deve ser titular de uma dupla competência: por um lado, competência para legislar em matéria ambiental e por outro lado competência para tributar. A atribuição de um papel de relevo às finanças locais na criação ou na gestão dos impostos ambientais pode, não só permitir atenuar alguns dos factores que propiciam a degradação ecológica a nível local, como também reforçar a eficácia da intervenção ambiental e a autonomia constitucionalmente reconhecida aos entes locais. No entanto, não devemos abdicar da adopção das devidas cautelas para evitar situações de injustiça e os efeitos negativos de um fenómeno de concorrência fiscal.


O sujeito passivo

O facto gerador do imposto deve ser, em princípio, o próprio acto contaminante, e, portanto, deve ser considerado como sujeito passivo aquele que perturbou o equilíbrio ecológico. Nesta medida, deve ser o agente contaminador que fisicamente praticou o acto causador de poluição quem assume a qualidade de sujeito passivo na relação tributária originada pelo acto em causa. Assim, a situação ideal é aquela em que as qualidades de sujeito passivo e de contribuinte de facto são assumidas pelo poluidor. No entanto, por vezes, é necessário optar por outra solução por quatro razões essenciais:
Ø Complexidade em identificar quem é o agente que causa danos ao ambiente;
Ø Efeitos difusos e longínquos dos resultados em relação às suas fontes;
Ø Fenómeno da repercussão fiscal;
Ø Razões de natureza económica e social;
Temos, pois, dois planos. Será poluidor directo aquele que com a sua actividade física vai dar causa imediata às emissões poluentes e será poluidor indirecto aquele que beneficia com o exercício da actividade poluente ou que cria as condições necessárias ao desenvolvimento desta. Pergunta-se, qual deles deve assumir o imposto ambiental?
Desde que haja procura vai haver oferta e só os bens para os quais existe procura são produzidos. Assim, o contribuinte deve ser aquele que consome o produto ao qual estão associados efeitos poluentes na medida em que é ele o causador último da poluição, o seu responsável final ou o “primeiro poluidor”. Consegue-se, desta forma, um estímulo à redução do consumo do bem poluente o que vai desde logo, incentivar os produtores deste produto a desenvolver e a aplicar técnicas e processos mais sustentáveis do ponto de vista ambiental.


A receita do imposto ambiental


Esta pode integrar a receita geral do Estado ou ser consignada a determinados fins. O imposto ambiental pode ser utilizado na concessão de subsídios ou na redução de outros impostos sendo que, neste caso, alguns autores entendem ser possível ocorrer um duplo dividendo. No entanto, as finalidades específicas eleitas podem ser variadas quando se opte pela afectação da receita dos referidos impostos podendo subsidiar-se medidas de apoio à melhoria da qualidade ambiental ou às vítimas da poluição.
O “duplo dividendo” visa salientar a possibilidade de se gerar um benefício para a economia através da aplicação das receitas obtidas com a cobrança dos impostos ambientais na redução de tributos preexistentes que sejam responsáveis pela distorção do funcionamento da economia. Coloca-se, desta forma, a hipótese de a devolução à economia da receita obtida com a cobrança do imposto ecológico melhorar a distribuição dos recursos, reduzir o desemprego involuntário e aumentar a eficiência económica.
No que concerne aos subsídios podemos afirmar que estes assumem duas funções principais. Por um lado, a função de fornecer um estímulo positivo à alteração de comportamentos para moldes mais sustentáveis, por outro lado, reduzir o impacto económico negativo causado pela introdução de medidas de protecção do equilíbrio ecológico. Todavia, enquanto instrumentos de incentivo ao investimento em tecnologias de controlo da poluição, eles são, ineficazes e ineficientes, e isto porque, os investimentos em causa têm que provocar um acréscimo do custo privado marginal de produção e do custo privado médio de produção. Assim, quando este incremento de custos ocorre, só um apoio que cubra a totalidade da despesa pode estimular a sua execução. Além de tudo isto, os subsídios reduzem os custos privados do produto ao qual estão associados encargos ambientais (na medida em que a disparidade entre os custos privados e os custos sociais aumenta) tornando-os por isso ineficazes. Também o facto de concederem um tratamento preferencial a apenas um dos factores produtivos introduz distorções na utilização desses mesmos factores.



Conclusão


A solução mais eficiente, ou seja, aquela que faz a sociedade incorrer no menor custo para eliminar uma certa quantidade de emissões poluentes, parece ser aquela que não impõe a todos os poluidores a realização do mesmo esforço, conferindo-lhes flexibilidade para elegerem a solução mais adequada para o seu caso. Os instrumentos de incentivo económico parecem ser os mais propícios à realização dos objectivos pré-definidos ao menor custo. Os instrumentos económicos por seu lado, podem reduzir este encargo de duas formas:
Ø Permitindo diminuir os custos associados à protecção do equilíbrio ecológico, ao actuarem preventivamente;
Ø Permitindo gerar receitas, as quais podem ser utilizadas quer na prossecução da politica ambiental quer na redução de outras componentes do sistema fiscal responsáveis por distorções no funcionamento da economia;
Os impostos ambientais, transmitem aos agentes económicos um estímulo contínuo e permanente, para que estes no longo prazo, procedam à redução das suas emissões poluentes, substituindo os produtos mais propícios a gerar desequilíbrios ecológicos por outros com menor aptidão para o fazerem, desenvolvendo novas tecnologias que sejam aptas a promover a sustentabilidade, bem como, adoptando técnicas inovadoras de controlo de emissões.
Qualquer uma destas vias permite reduzir o custo associado à obtenção de determinado nível de qualidade ambiental diminuindo ao mesmo tempo a responsabilidade fiscal do poluidor.