quinta-feira, 4 de junho de 2009

Princípio do Poluidor-Pagador (Vertente Positiva e Negativa)

O princípio do poluidor pagador nasceu no quadro da O.C.D.E. e adquiriu posterior consagração comunitária, através do Acto Único Europeu, onde encontrava a sua sede no actual artigo 174º, n.º2, do Tratado da União Europeia. Mas, para além de regra de direito internacional e de direito comunitário, este princípio goza também, entre nós, de natureza constitucional, uma vez que representa um corolário necessário da norma do artigo 66º, n.º2, alínea h), da Constituição, que impõe ao Estado a tarefa de “assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com ambiente e qualidade de vida”.
Este princípio decorre da consideração de que os sujeitos económicos, que são beneficiários de uma determinada actividade poluente, devem igualmente ser responsáveis, pela via fiscal, no que respeita á compensação dos prejuízos que resultam para toda a comunidade do exercício dessa actividade. Nos nossos dias, o alcance do princípio do poluidor-pagador tem vindo a ser alargado no sentido de se considerar que uma tal compensação financeira não se deve apenas referir aos prejuízos efectivamente causados, mas também aos custos de reconstituição da situação, assim como às medidas de prevenção que é necessário tomar para impedir, ou minimizar, similares comportamentos de risco para o meio ambiente, de acordo com a posição do Prof. Vasco pereira da Silva. Este é mais um dos princípios que estão expressamente consagrados no art.3º da Lei de Bases do Ambiente.
“(…)sendo o poluidor obrigado a corrigir ou recuperar o ambiente, suportando os encargos daí resultantes, não lhe sendo permitido continuar a acção poluente”.
Porém, devido à abundância de interpretações discrepantes de que tem sido objecto este princípio, importa, realizar uma abordagem negativa do mesmo, dizendo aquilo que não é, e por fim passar por uma abordagem positiva, realçando os seus traços principais.
O Princípio do Poluidor pagador não é o mesmo que responsabilidade civil por danos ambientais, trata-se de uma ideia errada, pensar que este tem uma natureza curativa e não preventiva, uma vocação para intervir a posteriori e não a priori. Apesar da formulação, poder recordar um principio jurídico segundo o qual quem causa o dano é responsável devendo suportar a sua reparação, o Prof. Gomes Canotilho, entende com apoio de grande parte da doutrina, que não se reconduz a um mero princípio de responsabilidade civil. Isto não significa que se negue no Direito do Ambiente vigore o princípio da responsabilidade subjectiva, que se funda na culpa, ou objectiva, com a obrigação de reparar o dano independentemente da culpa do agente, por danos causados. Este Professor, entede que a identificação deste princípio com o princípio da responsabilidade, não corresponde ao sentido que aquele historicamente surgiu, formulado primeiro pela OCDE e recebido, pouco mais tarde, pela Comunidade Europeia. A identificação deste princípios a nível doutrinal, constituiria, uma perda do sentido útil de ambos, um verdadeiro desaproveitamento das potencialidades dos dois. A prossecução dos fins de melhoria do ambiente e da qualidade de vida, com justiça social e ao menor custo económico, será indubitavelmente mais eficaz se cada um dos princípios se “especializar” na realização dos fins para os quais esta originalmente mais vocacionado, seja o princípio da responsabilidade, para a reparação dos danos causados ás vítimas, seja o princípio do poluidor pagador, para a precaução, prevenção e redistribuição dos custos da poluição.
No entanto, ao realizar uma abordagem positiva deste princípio, este é o que permite com maior eficácia ecológica, com maior economia e equidade social, realizar o objectivo de protecção do ambiente. Os fins que este princípio permite realizar são a precaução e a prevenção dos danos ao ambiente e a justiça na redistribuição dos custos das medidas públicas e luta contra a degradação do ambiente. Assim, aos poluidores não podem ser dadas outras alternativas que não deixar de poluir ou então ter que suportar o custo económico em favor do Estado que, por sua vez, deverá afectar as verbas assim obtidas prioritariamente a acções de protecção do ambiente. Os poluidores terão que fazer os seus cálculos de modo a escolher a opção economicamente mais vantajosa: tomar todas as medidas necessárias a evitar a poluição ou manter a produção no mesmo nível e condições e, consequentemente, suportar os custos que isso acarreta.
Assim, se o valor a suportar pelos poluidores for bem calculado, atingir-se-á uma situação socialmente mais vantajosa, a redução da poluição a um nível considerado aceitável e a criação simultânea de um fundo público, destinado a, combater a poluição residual ou acidental, a auxiliar as vítimas da poluição e a custear despesas públicas de administração, planeamento e execução da política de protecção do ambiente. Se, mesmo depois da aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador, a situação alcançada ainda não for a ideal e houver poluição a mais, ou fundos a menos, então o legislador deverá elevar um pouco mais o montante dos pagamentos a efectuar pelo poluidor, até conseguir que ele adopte o comportamento considerado ambientalmente desejável. Por isso, o montante dos pagamentos a impor aos poluidores não deve ser proporcional aos danos provocados mas entes aos custos de precaução e prevenção dos danos ao ambiente. De recordar, que este princípio, actua antes e independentemente da existência dos danos ao ambiente terem ocorrido, antes e independentemente da existência de vítimas. Por isso os pagamentos decorrentes do princípio do poluidor pagador devem ser proporcionais aos custos estimados, para os agentes económicos, de precaver ou de prevenir a poluição. Só assim os poluidores serão motivados a escolher entre poluir e pagar (ao Estado), ou pagar para não poluir (investindo por exemplo, em processos produtivos ou matérias primas menos poluentes, ou em investigação de novas técnicas e produtos alternativos).
O resultado alcançado será sempre mais vantajoso em termos sociais, ou deixa praticamente de haver poluição e, portanto, os poluidores pagadores, ou então a poluição se reduz a níveis mais aceitáveis e os poderes públicos responsáveis pelo ambiente passam a dispor de verbas para afectar ao combate à poluição, sem com isso onerar mais os contribuintes em geral, eles próprios, quantas vezes, duplamente vítimas de poluição (vítimas ao suportar “na pele” os danos originados pela poluição e vítimas ao sofrer economicamente com o agravamento da carga fiscal para dotar o Estado de meios de combate à poluição e aos danos ambientais. Sendo este, outro grande mérito do princípio do poluidor pagador, a criação de verbas para o Estado afectar ao combate da poluição, evitando que os contribuintes tenham que custear, através dos impostos que pagam, as medidas tomadas pelos poderes públicos para a protecção do ambiente, sejam elas medidas legislativas, administrativas ou actos materiais. Pelo contrário, deverão ser criados fundos alimentados pelos poluidores, dos quais sairão as verbas necessárias à realização das despesas públicas de protecção do ambiente. Esta é a política do “equilíbrio do orçamento ambiental”, também denominada política de “reciclagem de fundos”, e consiste da angariação coactiva de fundos entre os poluidores, destinados ao financiamento da política de protecção do ambiente, permitindo assegurar equidade na redistribuição dos custos sociais da poluição e, sobretudo, protecção eficaz e económica do ambiente.
O princípio do Poluidor Pagador desempenha uma função que, em linguagem económica, se denomina internalização das externalidades ambientais negativas. Actividades geradoras de externalidades negativas são aquelas que impõem custos a terceiros independentemente da vontade destes e também independente da vontade de quem desenvolve essas actividades. Por exemplo, os danos causados aos moradores vizinhos pela poluição atmosférica provinda de uma fábrica de pasta de papel, ou os danos causados aos pescadores fluviais por uma descarga de uma fábrica de tintas. A internalização das externalidades que as taxas realizam significa que, por este meio, se forçam os poluidores e ter em consideração, nos seus cálculos económicos, os prejuízos provocados á sociedade em geral pela actividade que desenvolvem e, mais do que isto, se forçam os poluidores a modificar a sua conduta tornando-a socialmente menos nociva.
Como exemplos de aplicação do Princípio do Poluidor Pagador, no artigo 24º n.º1 alínea c) da Lei de Bases do Ambiente, sobre resíduos e efluentes, fala-se: “(…) da aplicação de instrumentos fiscais e financeiros que incentivem a reciclagem e utilização de resíduos e efluentes”.; no artigo 6º do Decreto-Lei n.º293/97, de 9 de Setembro, relativo à gestão dos resíduos esclarece-se que : “(…) os custos de gestão dos resíduos são suportados pelo respectivo produtor”. É por força desta norma que, não só para cobrir os custos, como também para estimular a redução da produção de resíduos, a deposição de resíduos em aterros está sujeita ao pagamento de taxas.